quinta-feira, 24 de julho de 2008

Comentário sobre o filme "O Grande Ditador", de Charles Chaplin

Olá, caros amantes da Filosofia e da Arte. Apresento aqui uma reflexão sobre um filme especial, "O Grande Ditador" (1940), do Chaplin, e algumas propostas de atividades nas aulas de filosofia, sobre ética e política. Então, vejamos uma cena marcante do filme e algumas análises mais gerais sobre o mesmo.
Bem, como é sabido por muita gente, esta é uma cena que entrou para a história do cinema, quando o genial Charles Chaplin constrói uma sátira sobre o nazi-facismo, que dominava a Europa, desde meados da década de 1930. É importante o registro de que o filme foi lançado em 15 de outubro de 1940 e foi o primeiro filme falado de Chaplin.

O ator inglês representa dois personagens, o barbeiro judeu, que no início combate na 1ª Grande Guerra, como cadete da nação "Tomânia", tentando salvar um soldado chamado Schultz, que mais tarde se torna oficial do exército do imperador Hynkel (a crítica aqui é direcionada a Hitler), e que constitui o outro personagem de Chaplin.

Obcecado pelo poder, Hynkel quer dominar o globo, espalhando seu desejo de domínio a todos os povos. Ele se julga controlador do destino das nações, daí a idéia de segurar o mundo com as mãos, como se vê na cena. Aqui, podemos refletir sobre o totalitarismo na política, e citar a filósofa judia Hannah Arendt (1906 - 1975), que pode mediar esse interessante debate com a turma. Como se vê no pensamento da filósofa, a importância da ação política e a valorização do espaço público são dois elementos que se contrapõem às experiências totalitárias, e que podem servir aqui de contraponto para esta cena do filme, pois na Alemanha dos anos 30, "havia a impossibilidade de viver a Política, e o cidadão estava privado do diálogo com seus pares" (Revista: Discutindo Filosofia, Ano 2, n.7, pp.34-35).

Um outro momento interessante para o trabalho em sala de aula, é fazer a análise dos dois discursos, o inicial, que comicamente ilustra a insanidade do "Ditador", e toda a descarga de preconceito e totalitarismo que o alimenta, e, no segundo, na cena final do filme, em que o barbeiro judeu é obrigado a falar, pois é confundido com o próprio Hynkel. Neste emblemático discurso, que vai sendo construído numa escalada emocional crescente por parte de uma brilhante interpretação de Chaplin, é possível apresentar vários aspectos interessantes, como a influência da doutrina da não-violência, propugnada pelo líder hindu Mahatma Gandhi (1869 - 1948), quando ouvimos da boca do pseudo-imperador: "a terra, que é boa e rica, pode prover a todas as nossas necessidades", além da defesa dos direitos humanos ("o caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos"), e de uma crítica severa à civilização moderna da técnica e do progresso, fatores que subjugaram o ser humano ao domínio das máquinas ("a máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria"). O debate pode também ser complementado pelo professor com tópicos da política e da história do século XX, contexto marcado por duas grandes guerras mundiais, de caráter eminentemente irracional e totalitário, sobretudo na segunda, com a fatídica experiência dos campos de extermínio nazista.
Aqui, é oportuna a participação dos professores de História, Geopolítica e Sociologia, para uma interessante reflexão interdisciplinar com a turma ( alguns temas interessantes podem ser propostos por estes professores, tais como: o contexto histórico das Guerras Mundiais, suas motivações e implicações, a configuração do mapa europeu neste contexto, o envolvimento de nações de outros continentes, o impacto social, político, econômico e cultural das guerras sobre as nações envolvidas e outros).

Outra sugestão é contrapor a estratégia totalitária, fundada na cobiça e no ódio, ao elemento ético do respeito à diversidade e à prática do amor, como contrapropostas a esta infeliz experiência histórica. Se o debate permitir, os alunos poderão relatar experiências históricas que levaram o projeto de uma humandidade justa e feliz ao fracasso, assim como relatos de fatos ou biografias (pode ser um tema de pesquisa para futuras aulas e debates motivado pelo professor) que impulsionaram o ser humano para novos horizontes, novas utopias, como o próprio discurso de Chaplin, ao final do filme. Vale ficar com as últimas palavras do histórico discurso, quando ele evoca o amor a Hannah, mesmo ela ausente:

"Hannah, estás me ouvindo? Onde te encontrares, levanta os olhos! Vês, Hannah? O sol vai rompendo as nuvens que se dispersam! Estamos saindo da treva para a luz! Vamos entrando num mundo novo - um mundo melhor, em que os homens estarão acima da cobiça, do ódio e da brutalidade. Ergue os olhos, Hannah! A alma do homem ganhou asas e afinal começa a voar. Voa para o arco-íris, para a luz da esperança. Ergue os olhos, Hannah! Ergue os olhos!".

Aqui, o professor de filosofia pode finalizar o encontro enfatizando aos alunos uma nova percepção da palavra "esperança", pautada numa ética solidária e universal, movida por uma ação política consciente e transformadora, onde os seres humanos estejam em equilíbrio com os seus semelhantes, com a natureza, consigo próprios e com os seus princípios valorativos...

Até o próximo bate-papo sobre filosofia e cinema, nas conversas de nosso blog...

Abraços quixotescos!
Jorge Leão

Sócrates na Praça

Mais um texto de uma jovem filósofa da turma 204, Juliana, sobre o que aconteceria a Sócrates, ao se deparar com o cenário contemporâneo em que vivemos. Obrigado Juliana, pela valiosa contribuição!
Abraços em todos os amigos e amigas da sabedoria.
Jorge Leão

Sócrates na praça
O que Sócrates pensaria se pudesse viver os dias de hoje? Se fosse possível que Sócrates passeasse por uma grande cidade nos tempos atuais, veria ele pessoas apressadas, literalmente correndo a seu trabalho. Notaria a diferença, forte diferença, do uso de uma praça. Em seu tempo, ali se discutiam os problemas da pólis, ali eram tomadas todas as decisões referentes ao grupo “pólis”. Em nosso tempo, quando muito, a praça serve de lugar de encontro de amigos ou casais apaixonados.

Se alguém o chamasse para sua casa, notaria a falta de escravos. Veria o anfitrião ou um empregado pago fazendo seus agrados. Isso se pudesse entrar. Em nosso tempo, estranhos devem ficar bem distantes, nunca se sabe em quem confiar.

Ao entrar em uma biblioteca, veria muitos escritos, muito velhos e se impressionaria da vastidão de ensinamentos quase nunca observada pelas pessoas do nosso tempo. Se pudesse caminhar no centro comercial, veria pessoas falando com aparelhinhos colados aos ouvidos, como se dentro deles houvesse alguém escutando. Ouviria sons de carroças mecânicas, se movendo, incrivelmente, sem o uso de nenhum animal. Pessoas falando em cones emitindo um som demasiadamente alto, incompatível com a voz humana. Tudo se tivesse tempo, pois logo seria arrastado por uma multidão, que vai e vem em marcha acelerada.
Andando um pouco mais, veria casa onde se fazem leis e casa onde se fazem cumprir. Veria pessoas entrando e saindo dessas casas com ares de importância em carroças mecânicas das mesmas das que vira, sem deixar de observar que estas novas eram estranhamente mais atraentes. Claro que dependeria um pouco da sorte, eles teriam que ir a essas casas.

E se Sócrates pudesse entrar em uma de nossas escolas!? Aulas maçantes, assuntos estressantes e alunos que de qualquer forma tentam decorar o assunto que lhes será cobrado, sem saber sequer qual finalidade prática em suas vidas terá uma tabelas periódica ou a fórmula de Bhaskara. Alunos que depois de 12, 13, 14, 15 anos “estudando” terão seus destinos escritos por uma prova, segundo a qual a diferença entre ser bem sucedido e estar condenado ao fracasso total reside unicamente em marcar um “xis” no lugar certo. Veria que muitos jovens vão se perdendo em meio ao medo de “não conseguir dinheiro para comprar sem se vender”...

E ao assistir uma aula de filosofia, não veria nada mais do que alunos que aparentam não entender nada e uma leva de professores – salvo raras exceções - que não compreendem o porquê deles não entenderem. Não seria então o que eles também não entendem?

Nas ruas olharia para o alto, atraído por um barulho estranho. Veria um pássaro grande, muito grande, que voa sem bater asas, antes de tropeçar em um corpo no chão de alguém que, embora não pareça, está muito vivo para implorar por ajuda, uma intervenção divina. E se perguntaria, talvez, por que ninguém o socorre. Teria logo ali a resposta: porque ninguém o vê.

A noite cairia e ele não mais veria a multidão de horas antes. Estariam cansados da correria do dia. Veria estrelas brilhantes pregadas em montanhas que não eram de terra. Eram de algo duro, cinza e agora frio. Letras que não conhecia e pessoas magicamente ampliadas nessas estrelas, paradas em eterna pose, eterno sorriso.

Andando pelas ruas, com sorte achasse uma janela entreaberta para ventilar um pouco a sala de uma família que descansa, e para dentro olharia. Sóis pequeninos colados no teto fazendo da noite de fora o dia ali dentro. Uma caixa estranha cheia de fios ao longe que mantinha quase hipnotizado um jovem sentado a sua frente chamaria a atenção. Ouviria barulhos em uma caixa que emite som, veria pessoas seminuas ou se rindo como atores de comédia em outra que além de som traz imagens também. E talvez se perguntasse como cabe alguém ali dentro. Ou por que alguém perderia tempo com gracinhas tão escachadas. Até que chega o horário político e todos se retiram da sala. Dentro da caixa agora estavam pessoas que falavam a ele, tentando persuadi-lo a votar e “votar certo”, enumerando prováveis melhorias se fossem eleitos. E ficaria feliz: república.

Ao fim dos discursos, como num passe de mágica, voltaria uma dupla séria falando para a família que retornava à sala de mais um caso de corrupção e impunidade, e todos cansados disso, fariam cara de desdém ou exclamassem um “de novo”, seguido de algumas palavras de baixo calão. E confuso, talvez ele decidisse meditar em um lugar, em um tempo mais calmo. E Sócrates não mais ficaria feliz.

Juliana Galeno T - 204

terça-feira, 22 de julho de 2008

Sócrates na Praça Deodoro

Caros amigos e amigas de nosso blog,
há mais ou menos quatro anos escrevi um texto para minhas aulas sobre o papel da filosofia no mundo, tendo como ponto de referência a figura de Sócrates; a idéia na época foi a de problematizar o pensamento socrático tendo como cenário a Praça Deodoro, em São Luís, e a minha inquietação era, entre outras coisas, saber o que Sócrates nos diria, ao ver este cenário contemporâneo?... Seria fantástico viajar no tempo, e tê-lo conosco para um diálogo daqueles, que podemos ler nas obras de seu mais ilustre discípulo (Platão). Daí, partindo dessa situação hipotética, lancei o mesmo desafio aos alunos, e até hoje continuo lançando...
Este texto é bem recente, da Anne Rabelo, nossa colega amiga da turma fantástica 204, de Design de Produto; o título, como podem observar, foi mantido por ela.
Abraços em todos! E obrigado, Anne pelo belo texto!!!
Até breve!
Jorge Leão


SÓCRATES NA PRAÇA DEODORO

Mais um daqueles dias, em que estava atrasada para chegar ao trabalho no horário, tentava correr entre aquela multidão que passava assim como eu, atrasada, na Praça Deodoro. Então, sem um porquê lógico a princípio, eu parei subitamente em meio àquelas pessoas, e me perguntei:

- Por que correr daquele jeito? Por que passar correndo em lugares que merecem muito mais serem admirados do que pisados na correria do dia-a-dia?

Sentei-me em um banco e esquecendo-me do horário, do atraso e de tudo mais que pudesse tirar minha concentração, tentava achar respostas para as perguntas tão confusas ao meu pensamento. Lembrei-me de um certo filósofo grego que ouvi falar durante toda a minha vida, mas que descobri quem realmente era e o que fazia, quando cursei a 5ª série, chamava-se Sócrates, era um gênio e apesar de toda sua inteligência e astúcia para desenvolver teorias até hoje aceitas por muitos, não se considerava com tal estima.

Imaginei o que Sócrates pensaria dessa nova utilização da praça, levando em consideração que a praça em sua época, quer dizer a “àgora”, era um local de encontro para discutirem sobre problemas da sociedade, se relacionarem com os outros... Enquanto hoje para maioria da sociedade é apenas um local de passagem.

Foi então que ao meu lado sentou-se um senhor estranho, vestido com roupas estranhas e ele começou a conversar comigo:

- Por que todos passam apressados por esta “àgora”, não param para conversar, admirar o local?
Perguntei a ele:

- O senhor sabe onde estamos?

- Sim eu sei, em uma “àgora”, em Atenas, mas não estou entendendo o estranho comportamento e vestimenta de todos.

- Senhor, estamos em uma Praça em São Luís- MA, no Brasil.

- Mas, como pode, eu estava em Atenas e agora estou aqui neste tal de Brasil?!

- Meu Deus, mas que coisa estranha. Como você se chama?

- Sócrates.

- Eu é que pergunto como pode, estamos no ano de 2008 e você, que se diz Sócrates, que viveu de 470 a 399 a.C., isso é muita loucura devo estar cansada ou delirando.

- Não, eu estou aqui, apesar de tudo ser muito confuso, mas para tudo há uma resposta. Então me fale sobre você e sua época.

Sócrates e eu conversamos durante horas e ele me perguntou por que as pessoas passavam umas pelas outras e não se cumprimentavam ou paravam para conversar ou pelo menos andar mais devagar para admirar o que havia de bonito ali naquele lugar. E eu respondi que as pessoas desta época vivem sem tempo para quase tudo, até para viver a vida como se deve, vivem aqui apenas para ganharem dinheiro e sobreviver, ou seja, vivem por viver.

E quando terminei de lhe responder, ele começou a sumir e cordialmente despediu-se de mim. Olhei para os lados e não mais o vi, o sol já estava desaparecendo no horizonte e eu ali sentada em um banco da Praça Deodoro desde a manhã, sem muitas perguntas para eu mesma, fui para casa, sabendo que amanhã voltaria tudo ao normal.

ANNE RABELO
DESIGN DE PRODUTO - TURMA 204 / julho de 2008

Processo contínuo

Socializo com os amigos e amigas de nosso blog esta reflexão de nossa aluna Mayra Lisboa, mais uma colaboração dela, sobre o que estamos a fazer de nossas vidas... muito bom o texto! Abraços em todos os alunos da 205! Valeu!
Jorge Leão

Processo contínuo

Somos eternos aprendizes da vida. A aprendizagem é algo contínuo, que, com o passar do tempo, se torna cada vez mais, independente da idade, importante. Não sabemos de tudo, ou melhor, não nascemos sabendo, e tudo que temos a falar para os nossos filhos, netos ou bisnetos, simplesmente aprendemos, com a vida.

Muitos dizem que as pessoas devem curtir a vida, mas a verdade é que muitas vezes esse "curtir", faz com que as pessoas percam ao invés de ganhar, grande parte de suas vidas. Mas... pra quê? Porque as pessoas não vivem para construir uma vida, que mesmo após a morte, nunca morrerá. Insistem em serem escravos de um mundo e de um cotidiano que irá acabar.

Muitos dizem que não são nada, mas a verdade é que "nada", é a não-existência; essas pessoas existem, têm uma vida, porém não fazem valer essa existência.

Por que não pensar, por que não agir? Pois a nossa única prisão hoje somos nós mesmos. As pessoas não vieram ao mundo simplesmente para crescer, casar, ter filhos e morrer, existe algo mais, mais importante e valoroso do que somente isso. Onde estão nossas forças, que tanto insistimos em demonstrar, sendo violentos, matando, roubando, onde está esta força na hora de fazer a diferença? Nessa hora, é que mostramos o quão somos fracos e impotentes, o quão somos pequenos e incapazes de mostrar nossas "asas" quando é preciso. É neste momento, que podemos nos denominar um "nada", vazio e sem existência, pois não somos sequer capazes de mostrar o quanto somos fortes e ágeis diante das injustiças do mundo.


Mayra Francisca M. Lisboa
Design Gráfico, 205
Julho de 2008

segunda-feira, 21 de julho de 2008

É possível uma alternativa aos vestibulares?


Vejamos um debate intrigante e necessário, quando o tema é vestibular. E você, o que pensa disso? Eis um texto refletindo sobre este tema polêmico, a partir de uma experiência interessante, que são os projetos de iniciação científica júnior, realizada por meio de um convênio entre FAPEMA e escolas públicas maranhenses. Opine sobre o debate, deixando aqui seu comentário...

Abraços quixotescos!
Jorge Leão



É possível uma alternativa para os vestibulares ?


No cenário contemporâneo, a proposta de um conhecimento integrado faz-se de urgente presença. Desse modo, observa-se a necessidade de uma mudança de paradigma, isto é, de modelo interpretativo, a partir da visão de escola que ainda vigora. Os problemas globais exigem soluções interdisciplinares. Não se pode mais conceber a resolução de problemas de ordem complexa com práticas fragmentadas ou mesmo isoladas de um contexto mais amplo. Pensar a escola, então, a partir de bases científicas contextualizadas às exigências do ser humano nas teias de relações em que tece sua jornada neste planeta. Eis o grande desafio.

Ora, uma das vias de acesso a este processo de pensamento integrado no ambiente escolar é a prática da pesquisa científica. Entre professores e estudantes, as iniciativas deverão estar fomentadas dentro de uma metodologia investigativa e participativa. Com o vínculo da pesquisa científica, o próprio entendimento do papel da escola muda radicalmente. Dentro da realidade vista em nosso mundo contemporâneo, o trabalho pedagógico deve ser realizado a partir de uma visão holística de conhecimento, isto é, compreendendo o ser humano integralmente, a fim de contribuir para a inserção da escola de modo transformador no mundo globalizado em que a mesma se situa. Como assinala o pensador francês contemporâneo, Edgar Morin: “um pensamento capaz de enfrentar a complexidade do real, permitindo ao mesmo tempo à ciência refletir sobre ela mesma” (MORIN, 2005, p. 31).

Mas, é possível observar este novo modelo no contexto da escola contemporâneo? Ora, aqui no Maranhão, algumas escolas públicas estão iniciando esta árdua caminhada por meio da inserção da pesquisa. No contexto específico do Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão, e também outras instituições como o Liceu Maranhense e o CEGEL, foi realizado um convênio interinstitucional com a FAPEMA, Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão, desde o ano de 2006, pelo Programa de Iniciação Científica Júnior, o PIBIC-Jr., em que vários projetos de pesquisa foram desenvolvidos com êxito, tanto a nível de ensino médio quanto a nível de cursos técnico-integrados (no caso do CEFET-MA), no período de um ano, com bolsas mensais no valor de R$ 100,00 para cada bolsista. Vale aqui o registro da participação de nossos estudantes pesquisadores na 59ª Reunião Anual da SBPC, e da 15ª SBPC Jovem, na cidade de Belém – PA, no período de 8 a 13 de julho de 2007, como, mais recentemente, na 60ª SBPC em Campinas, e na 16ª SBPC Jovem, nos dias 13 a 18 de julho de 2008, com um ótimo desempenho de todos os representantes maranhenses. A avaliação dos professores é que os resultados finais dos projetos indicam um nível de responsabilidade, compromisso com a pesquisa pelos jovens estudantes, sem falar na mudança de percepção do papel da escola pelos próprios estudantes, elementos que nos entusiasmam e ratificam a certeza de que o caminho da pesquisa promove a autonomia intelectual.

Por isso, a Coordenação do Projeto PIBIC-Jr, no CEFET-MA, representada pelo incansável trabalho do Professor Fábio Henrique Silva Sales, apresenta este relato de experiência, no intuito de oferecer uma proposta concreta e alternativa de ingresso nos cursos de ensino superior por parte dos estudantes bolsistas e pesquisadores às nossas Universidades. A proposta é que toda pesquisa deverá ser acompanhada pelo professor orientador e pelo setor pedagógico da escola, a partir da instauração de um Núcleo de Pesquisa Interdisciplinar, e, ao término da mesma, os estudantes deverão apresentar um relatório final da pesquisa com os resultados obtidos a uma banca avaliadora, tal como já é feito junto à FAPEMA. A depender do desempenho dos estudantes, o conceito alcançado servirá de critério para o ingresso nos cursos superiores de nossas instituições de ensino, sem o tradicional vestibular.

Espera-se com isso ter uma avaliação mais profunda e qualitativa de ingresso de nossos jovens estudantes à Universidade. Como se sabe, o perfil de um aluno memorizador de fórmulas ainda predomina com os modelos de vestibular vigentes. No entanto, a pesquisa científica, já a nível médio, vem paulatinamente mudando este cenário, com o desenvolvimento de uma postura crítica, problematizadora dos conteúdos transmitidos, e também pela capacitação dos jovens estudantes a trabalharem em equipe e dando a eles elementos fundamentais para a promoção de atividades efetivamente crítico-reflexivas na escola, como produção de artigos científicos, relatórios de atividades, realização de pesquisas de campo, participação de grupos de estudos e em eventos científicos, a nível local e nacional.

Portanto, os benefícios da pesquisa na escola vinculam-se à contribuição que a ciência, apresentada pela realização de projetos de iniciação científica, poderá oferecer a um novo entendimento do papel da escola, em que professores e estudantes, estejam inseridos de modo direto no contexto concreto da sociedade em que vivemos. Sabe-se, contudo, que muitos interesses mercadológicos vão refutar tal proposta. Mas, já é chegado o tempo de debatermos com a sociedade se queremos manter nossos jovens robotizados pela memorização de dados inúteis à vida, como ainda é prática rotineira da maioria dos exames vestibulares, ou se a escola deve ser compreendida realmente como um instrumento de produção científica, autonomia intelectual e cidadania.

Jorge Leão
Professor de Filosofia do CEFET-MA e membro do Movimento Familiar Cristão

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAGNO, Marcos. Pesquisa na Escola – o que é como se faz. 19.ed. São Paulo: Loyola, 2005.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Saberes necessários à prática educativa. 28. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

MORIN, Edgar. Ciência com Consciência. 8. ed. revista e modificada pelo autor. Tradução: Maria D. Alexandre e Maria Alice Sampaio Dória. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.

______. A Religação dos Saberes – o desafio do Século XXI. 3. ed. Tradução e notas de Flávia Nascimento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.

sábado, 12 de julho de 2008

Análise de um quadro de Rembrandt: o filósofo meditando


Caros apreciadores e amantes da filosofia e da arte, apresento aqui um exemplo de como podemos associar elementos das artes plásticas às aulas sobre Filosofia da Arte, quando da apresentação dos elementos básicos do processo de criação, a saber: a imagem, a percepção e a representação de uma idéia.
Este quadro do pintor holandês Rembrandt (1606 - 1669) é um dos que trabalhei em sala de aula, durante as aulas sobre Filosofia da Arte, para as turmas de 3 ano, em novembro de 2007, para falar da condição humana do pensar e de sua relação com a criação estética.
Na minha opinião, ele merece uma atenção especial, sobretudo por que focaliza no ambiente da intimidade do pensador alguns elementos em contraste, como a escada em espiral, que se vê iluminada em sua base, deixando a sombra para a subida, como no processo do conhecimento, também em espiral, que nos impõe um certo impulso inicial, movido pelo prazer clarividente da descoberta, mas que depois é marcado por vários contrapontos, entre eles a dúvida e os constantes embates com a experiência. É importante frisar para os alunos sobre a importância do processo do conhecimento para a história da filosofia, desde a Antiguidade, até o momento em que se situa a obra de Rembrandt, isto é, na transição do período medieval para a Modernidade, com a expressão marcante dos pensadores renascentistas, que haviam retomado temas clássicos em suas obras, iniciados pelos filósofos gregos, dentre eles, o problema do conhecimento humano.
Outro ponto interessante de ser abordado nesta tela do pintor holandês é o foco de luz vindo da janela, aspecto característico de muitas de suas obras, como presença impactante no interior do quarto, dominado pela fraca luminosidade de uma quase desapercebida lareira à direita . O filósofo, em sua postura contemplativa, é como se estivesse atentamente ouvindo a canção matinal dos pássaros, ao amanhecer, aguardando com uma vivacidade silenciosa as novidades de uma janela que capta a luz cósmica, que ilumina o seu espaço cotidiano. E no canto direito, a presença de um jovem que cuida de uma pequena lareira, como a ilustrar a contraposição da vida contemplativa, representada pela presença do filósofo, e da vida operativa, cujo labor diário é dado pela execução de um ofício, no caso os afazeres domésticos. Este contraste, de certa forma, já vinha sendo apresentado desde a sociedade grega, e que encontra agora, com o advento da Modernidade, profundas mudanças de enfoque, uma vez que, paulatinamente, o trabalho manual passa a ter predominância sobre a atividade teorética, ou vida contemplativa.
Caros amigos e amigas,
Esses são, portanto, alguns elementos que podem ser trabalhados em sala de aula, quando de um tema tão recorrente à Introdução à Filosofia da Arte, como imagem, percepção e representação eidética, que é de fato marca significativa da expressividade estética de um gênio precioso como o de Rembrandt.
Abraços quixotescos! E até o próximo encontro com outros quadros!
Jorge Leão

Foto do I Fórum sobre Ensino de Filosofia


Este encontro marcou o término das atividades do nosso projeto, no dia 5 de outubro de 2007, no auditório do Liceu Maranhense, durante o I Fórum sobre Ensino de Filosofia, realizado em conjunto com a UFMA e os professores de Filosofia do Ensino Médio. Foi uma oportunidade ímpar para perceber o processo de autonomia intelectual que a pesquisa pode propiciar aos alunos. A apresentação foi marcada por muitos questionamentos vindos de estudantes da UFMA e também de professores, o que enriqueceu muito o debate e a socialização do projeto. Aqui estão comigo: Ciríaco, Virgínia, Irlana, Larissa Abreu e Larissa Régia. Neste dia, eles estavam realmente com muita vontade de debater, e foi muito estimulante perceber que eu estava sendo paulatinamente esquecido, escondido atrás do palco, sem dar uma palavra, somente ouvindo os jovens filósofos exporem com brilhantismo seus pontos de vista sobre a filosofia, o seu ensino e a envolvência da arte neste contexto. Continuaremos neste ritmo, sem acreditar que já cumprimos o nosso papel, ao contrário, apenas estamos dando os primeiros passos. Abraços em todos vocês, e grato por sua colaboração. Até breve, jovens aprendizes! Jorge Leão

O profissional de filosofia e o filósofo


Neste texto, encontra-se a sutil diferença entre o profissional de filosofia e o filósofo, que pode ser pequena, assim como abismal...
abraços quixotescos!
Jorge Leão

O PROFISSIONAL DE FILOSOFIA E O FILÓSOFO


“A filosofia como eu a entendi e vivi até agora, consiste em optar por viver nos cumes gelados, à busca de tudo que é insólito, digno de ser questionado, de tudo que até agora foi proscrito pela moral.”

Friedrich Nietzsche – Ecce Homo, Prefácio, §3

Pretender uma aproximação entre o cargo e o ato de ensinar requer, para qualquer área do saber, um esforço cuidadoso para a elaboração de uma reflexão possível.

Dentro de uma instituição, exercer uma profissão implica em seguir determinados modos de ação, como planos de trabalho, prazos a serem executados, sistemática avaliação das ações, isto é, um rigor que leva o profissional a uma disciplina direcionada ao ajustamento mínimo entre as regras de funcionamento institucional e as metas que se pretende alcançar.

No caso específico do ambiente escolar, o professor, como profissional da instrução pública, também se instaura dentro de um contexto social determinado. Ele segue prazos, elabora planos de aulas, roteiro de estudos, avalia os alunos, preenche diários de classe, entrega resultados, reúne-se com pais ou responsáveis e a direção da escola. Este é o momento burocrático na vida de qualquer professor. Assim também ocorre com o profissional de filosofia. Ele é aquele que dá aulas de uma disciplina chamada “filosofia”.

Contudo, o conhecimento filosófico não cabe em programas de disciplinas, simplesmente circunscritos por uma exigência burocrática. Até mesmo na elaboração de suas aulas, é preciso que o professor, não apenas de filosofia, possa pensar criticamente o que vai ser trabalhado durante suas exposições diárias. Se ele não exerce a postura filosófica da problematização, da contextualização e da argumentação, no âmbito do diálogo com a história da filosofia, torna-se impraticável qualquer prática coerente com o caráter reflexivo e transformador da filosofia.

Por isso, é inconcebível ao profissional de filosofia a ausência de uma formação filosófica consolidada pelo labor permanente do trabalho intelectual e da pesquisa. A implicação na relação com a sala de aula é logo percebida, quando o professor visualiza a sua constante interrogação sobre o que ele mesmo faz, pensa, diz, apresenta aos seus alunos.

Primeiramente, ele deve responder a pergunta: aquilo que faço é ensino de filosofia? E se é filosofia, em que âmbito deve ser levada, isto é, comunicada aos alunos? E ainda, qual a concepção de filosofia que inauguro em sala de aula? Tais questionamentos envolvem o entendimento de que o ensino de filosofia exige a atitude de um filósofo. Ou seja, o professor de filosofia deve compreender que o núcleo de realidade que ele se defronta, isto é, o conhecimento filosófico, traz como inquietude primeira a revisão do que já temos como critério objetivante de ação e conduta.

Levar a filosofia para o diálogo com a realidade, é possibilitar um primeiro passo na observação dos critérios de ensino, de métodos e de avaliação do processo pedagógico, que somente o filósofo é capaz de dar. Embora o fenômeno reflexivo não seja de uso exclusivo da disciplina “filosofia”, cabe ao filósofo instigar o modo de relação em que a própria filosofia é levada aos domínios escolares e a relação de composição organizada – ou desorganizada, pois fragmentada e superficial – que os seus conteúdos e temas mantêm com a mente dos alunos.

Para isso, a postura do filósofo é situada no âmbito de um espaço e de um momento histórico. Quando lança seus questionamentos à realidade ou às questões existenciais, o filósofo compartilha com uma comunidade a dimensão do pensamento. É desse modo que se constitui, na construção disciplinar, a necessária interação entre profissional e ser pensante. Um âmbito não pode jamais estar desvinculado do outro, sobretudo quando se pretende superar amarras institucionais, que muitas vezes passam pelo descumprimento elementar de qualquer processo pedagógico, que é dar aulas.

De nada adiantará desse modo, um assíduo contato com os textos filosóficos, se o professor de filosofia não mantém uma radical coerência com a realidade de encantamento, de uma necessária e permanente análise crítica e de busca investigativa que a filosofia pode suscitar nele mesmo e em seus alunos. Assim, longas citações ou explanações argumentativas podem contentar o intelecto do professor, mas nada dizer de significativo para a necessária correlação entre conteúdos e realidade pessoal e social dos alunos.

É possível até dizer que conteúdos filosóficos que não problematizem os temas abordados e que não lancem um espaço de discussão democrático em sala de aula, não constituem realmente conteúdos de filosofia, uma vez que a própria construção conceitual só é possível pelo exercício rigoroso do pensamento, dentro de uma assembléia politicamente instituída por sujeitos autônomos, isto é, livres pensadores.

O entendimento linear de conteúdos e programas, como algo simplesmente transmitido aos alunos com valor de verdade, deve sofrer abalos constantes do filósofo em sala de aula, ou seja, do professor que exerce a livre possibilidade de constituir o espaço de uma pólis pensante e atuante. Com isso, a dimensão do trabalho escolar, na elaboração das aulas, no diálogo com os outros professores (de filosofia e de outras áreas de saber), com grupos de estudo e de formação permanente, das avaliações dos conteúdos, das dificuldades enfrentadas, da metodologia de ensino adotada, deve compor a estrutura de base para extrair uma observação rigorosa e abrangente do papel social do filósofo na escola.

Desse modo estará garantido o espaço do professor de filosofia, que cumpre seus planos de aula dentro de um rigor disciplinar, mas que transcende, como filósofo, os limites dimensionais da fala determinada da burocracia institucional, pela atitude de abertura ao novo, ao significativo e ao poder de encantar e embelezar a vida, próprio da filosofia, enquanto modo de habitar o mundo de modo radical, livremente organizado pela consciência de uma postura filosófica ligada ao diálogo com a vida e suas exigências, quer no âmbito profissional-institucional, quer no âmbito filosófico-existencial.

Jorge Leão – Em: 25 – 09 – 07
Professor de Filosofia do CEFET-MA e membro do Movimento Familiar Cristão

Reaprendendo a pensar

Aqui seguem mais textos interessantes das turmas de Design, nas aulas de filosofia, sobre o papel da filosofia no mundo, abraços quixotescos,
Jorge Leão

Reaprendendo a pensar

De modo universal, com a vida contemporânea, muita coisa mudou com o ensino da filosofia e do pensar por extensão. E para pior. Com o passar do tempo, os pensamentos, as concepções e as ideologias também. Hoje, são poucas as idéias, ou referências de personagens da Grécia do século VI a. C., que ainda sobrevivem, pelo menos em parte.

Tomemos como base o estudante da atualidade. Ele não pensa, não observa, e são poucos aqueles que possuem metas rumo ao conhecimento, a maioria nem as tem. A única explicação possível para isso está nos vestibulares e concursos, pois os alunos de hoje só estudam aquilo que é posto nos editais, para eles não há necessidade de estudar algo que não os beneficiará. E é nesse quadro que se encaixa a filosofia, mais precisamente o pensar.

Mas, por que o pensar se enquadra nessa situação? O pensar não é simplesmente um exercício de reflexão interior para poucos usufruírem. A verdade é que as pessoas não usufruem, não buscam. Tudo que elas precisam para serem classificadas em um vestibular ou concurso outras pessoas já pensaram por elas.

Mas, o que fazer para resgatar ainda na escola o sentido do pensar? Não seria fácil mudar opiniões já formuladas e nem seria uma realização de prazo curto, pois ao introduzir novos meios de ensino para enfatizar o pensar, deve haver uma adequação do aluno ao novo ensino, o que não seria fácil, se não fossem utilizados meios que “induzissem” os alunos a pensar. Mas... que meios? Já paramos para pensar quantos alunos gostam ou pelo menos apreciam estarem na realização de projetos, gincanas, ou outros eventos na escola? Então, por que não reformular esses meios, fazendo com que eles não favoreçam diretamente o entretenimento, mas que sejam um veículo que leve o aluno a pensar? Ocorreria, assim, independente de lenta, uma transformação na forma de raciocinar dos mesmos. Em decorrência disso, os alunos que eram “obrigados” a pensar, a buscar, a investigar, o fariam por vontade própria.

O papel do professor e do aluno nesse processo vai além de apenas ensinar e aprender. Para se estabelecer um consenso, ambos deveriam interagir de maneira parecida, sem que haja algo que separe o professor de seu aluno na busca por conhecimento.

Mayra Francisca Lisboa
Estudante da Turma 205 / Design Gráfico / CEFET-MA

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Reflexões sobre o filosofar

Caros amigos do blog FILOSOFIA COM ARTE NO ENSINO MÉDIO, deixo aqui algumas reflexões sobre o filosofar, trabalhadas com os alunos da turma de Design, em 11 de julho de 2008,
abraços quixotescos!
Jorge Leão


REFLEXÕES SOBRE O FILOSOFAR


Quem se dedica à filosofia põe-se à procura do homem, escuta o que ele diz, observa o que ele faz e se interessa por sua palavra e sua ação, desejoso de partilhar, com seus concidadãos, do destino comum da humanidade.
Karl Jaspers- filósofo alemão do século XX


A todo homem é permitido o conhecimento de si mesmo e o pensamento correto.

Heráclito – filósofo grego do século VI a.C.


Uma vez que se tenha encontrado a si mesmo, é preciso saber, de tempos em tempos, perder-se – e depois reencontrar-se: pressuposto que seja um pensador.

Friedrich Nietzsche – filósofo alemão do século XIX


(...) os homens começaram a filosofar, agora e no princípio, pelo assombro, primeiro admirando-se das coisas estranhas que tinham mais à mão, e depois, ao avançarem pouco a pouco, fazendo questão das coisas mais graves, tais como os movimentos da Lua, do Sol e dos astros, e a geração do todo.”
Aristóteles – filósofo grego do século IV a.C.


O bem mais caro, o bem que não se vende, são as idéias. É com as idéias que o mundo é feito.

Rubem Alves – educador brasileiro


Só é considerado livre o ser humano que é autônomo, ou seja, capaz de pensar por si mesmo e dar respostas originais a si próprio e ao mundo.
Angélica Sátiro – filósofa brasileira


Nunca estamos tão dispostos a pensar por nós mesmos como quando nos encontramos envolvidos numa investigação compartilhada com outros.

Mathew Lipman – filósofo norte-americano

terça-feira, 8 de julho de 2008

Caros amantes da Filosofia e da Arte,

publico em nosso blog um texto nosso do ano de 2006, cujo título é o significado do nome "jorge", em grego,
abraços quixotescos,
Jorge Leão


Aquele que cultiva a terra...

Lanço o meu destino para o mais profundo da terra de mim mesmo. Sei que o doméstico segredo que me reconstitui por dentro é insuficiente para a cura da luta entre os contrários da alma que carregamos no drama da vida. A trágica imagem da seca na terra, onde uma perpétua solidão invade o tempo da última lembrança de paz que restou no sonho das horas de perda, agora recebe os louvores das piores tonalidades e emoção desmedida, que podem adoecer mais ainda a perdida insensatez que devora os restos escassos do fígado que nos alimenta as idéias.

É nesta direção que resgatamos o agricultor perdido no abuso das passagens dissonantes pela tangente do bom senso. Perdido nos destaques confusos de onde partimos para nutrir o espírito na semeadura da entrega. Não recordo o rebaixamento ou a estupidez de meus propósitos, apenas suplico devida abertura à dor encarnada que se depara como valor simbólico de um plantio a ser colhido no tempo dos últimos episódios da semente que deve morrer. Na graça que percorre a terra e mantém de pé o agricultor entregue ao cultivo, surge o pão arado no momento oportuno, que era trigo passado, agora fruto colhido.

Intenso é o ritmo da janela que se abre ao dia que nasce diante da terra esperando o arado. No calor escaldante do sol que queima, estremece o curso das águas que chegam para irrigar o lugar propício da semeadura. Corre o rio para o mar, e a terra da alma encanta-se de não bastar-se a si mesma a cada amanhecer. Por gerar a religião que nos eleva a terra, serenos conduzimos a pétala de rosa para mais um sopro de vento que passa.

As mãos do agricultor abraçam a serenidade da alma, no beijo demorado da declaração de amor aos sinais de tempestade que chega logo cedo, na candura das manhãs.

Jorge Leão
Professor de Filosofia do CEFET-MA

Artigo: Nas órbitas da poesia de Nauro Machado


Caros amigos do nosso blog FILOSOFIA COM ARTE NO ENSINO MEDIO, compartilho convosco um artigo sobre filosofia e literatura, do ano de 2007, a partir da poesia de Nauro Machado, na obra "As órbitas da água", em que se encontram temas fundantes de seu pensamento poético, tais como: a morte, o tempo, a cidade e Deus. É importante salientar que sua obra aproxima um diálogo vivo entre expressão poética e pensamento humano, quando de suas questões filosóficas fundantes. Abraços quixotescos!
Jorge Leão


Nas órbitas de Nauro

Comentário sobre a obra “As Órbitas da Água”[1], de Nauro Machado


Jorge Antônio Soares Leão
Professor de Filosofia do CEFET-MA



1 - Nauro pensa a morte

“Mas a morte zomba dos enigmas.
Ela é que os propõe.”

Maurice Druon – O menino do dedo verde



Os tons menores da música poética de Nauro Machado surgem como sinais matinais, no anúncio de uma palavra que se impõe como porta de acesso ao vulcão da existência, à “palavra mortal” que guarda, para o ser humano, e somente para ele a chegada da morte.

O tema da morte tem sido exaustivamente trabalhado e discutido por inúmeros filósofos, desde Platão (Cf. Fédon), até Heidegger (Cf. Ser e Tempo). Quando nada mais resta a dizer, resta o silêncio, diante da certeza inexorável do fim. Este tema é uma das preocupações contidas na obra do poeta maranhense Nauro Machado, explicitado nos sonetos de sua obra “As Órbitas da Água”.

Nos versos de Nauro Machado, pode-se encontrar mais que um diagnóstico frio e irrefutável do fato em si mesmo, como ocorre nas mesas dos médicos legistas. Ao contrário, o poeta alarga os horizontes da procura fundamental do humano, acerca do sentido possível para a morte, quando, quase sempre, tal tema é objeto de distanciamento, de dogma religioso ou de tratamento cético, pois impenetrável em sua linguagem.

A poética de Nauro Machado, contudo, lança elementos presentes no enredo trágico que lança o homem para a morte, como afirma o filósofo Martin Heidegger, em sua conhecida expressão “ser-para-a-morte”[2]. Neste sentido, a linguagem poética do autor maranhense desvela o que antes era resguardado ao silêncio inacessível do mistério, ressurgindo, com isso, como significado existencial do que se pode pensar acerca do problema fundamental da existência, isto é, o de encontrar um sentido humano para a finitude.

Por isso, a reflexão contida em “As Órbitas da Água” nos conduz para o pensar a morte como um problema humano e não para a simples evidência do fim da vida. Assim, o poeta lança a questão sobre o lugar fundamental da morte para a existência humana, por meio da linguagem. No início do Soneto 2, lê-se:

Desenrolar o verbo finamente
para a mortalha que afinal lhe veste.


Aqui, o finito encontra-se na possibilidade do dito, do verbo, vestido por tal “mortalha”. Durante a existência, o nada surge como sentido primeiro diante da morte, lugar resguardado sobretudo pelo poder da “palavra mortal”. Nauro Machado situa a existência humana na terra que permanece apavorada pela finitude, batendo constantemente à sua porta, quando assinala, no Soneto 3:

entre a terra e o pavor, meu céu devasso,
entre o Ser e o meu ser, o infindo espaço,
entre mim e ninguém, meu nada, só isso.


Então, o que fica para além da morte? Neste âmbito, é possível lançarmos uma questão: em que sentido o Nada, enquanto reflexo de um Niilismo existencial na poética de “As Órbitas da Água”, abriga a possibilidade de um falar acerca da morte? Talvez uma das vias de superação, ou mesmo da manutenção da contradição, seja a presença da idéia de Deus na obra do poeta maranhense, como um de seus elementos mais citados e problematizados. Contudo, o lugar de Deus implica na busca por uma dúvida autêntica, o que somente pode ocorrer por meio de uma filosofia da morte. Ou seja, o concreto absurdo da morte, estampado no cotidiano comum do dia-a-dia fatalmente distancia o ser humano desta tarefa.

Desse modo, o poeta aponta outra morte possível, que é concreta na vida podre sem sentido, que pode figurar também como um niilismo, que conduz a experiência imediata da superficialidade ao drama da frustração alienante do senso comum das coisas. Esta via de interpretação pode ser observada, ao lermos um trecho do Soneto 4, quando diz:

Dize pois, cruz na idéia cravada:
pior que a morte, sob a sepultura,
não existe nada? nada existe? nada?!
- Pior que a morte, sim, existe ter
a morte viva, a podre criatura
a todo instante e hora em nosso ser.


A existência é aqui convocada a pensar a morte, escapando de sua ruína em vida. É o que se observa na proposta de Heidegger, em “Ser e Tempo”[3], ao afirmar que “determinamos a idéia da existência como o poder-ser que compreende, e onde está em jogo seu próprio ser”. Enquanto impulso originário, a consciência do fim da existência, que chamamos de “morte”, perfaz o trajeto fundamental do ser que se revela como definido no tempo, a partir de duas possibilidades fundamentais, a saber: 1) a fuga diante do fato da morte, e 2) o pensar autenticamente a morte como problema[4].

No primeiro caso, confirma-se o distanciamento do sentido da busca. O ser é tomado pela cotidianidade de suas experiências fortuitas, de caráter acumulativo. O tempo determina que o fato da vida é envelhecer, e, fatalmente, morrer. Muitas pessoas entram em pânico ao ouvirem falar na palavra “morte”. Por isso, a reação aqui é de medo, insegurança, desconforto.

No segundo caso, porém, o ser humano é levado a questionar o fato da morte, entrando em processo de redimensionar o tempo a partir de sua possibilidade originária, no pensar a morte não mais como fato, mas como problema, que busca um significado humano, retirando da cena a sensação de temeridade e fuga, e ultrapassando até mesmo o próprio pensamento. O poeta vê-se então como arquiteto do sentido vital da morte, em sua “arquitetura da alma forma rara”[5], sendo tarefa do ser humano em sua solidão, uma vez que:

Só ao homem só pertence o pesadelo
de conceber, além do pensamento,
a aranha insone de mortal novelo
[6].

A morte escapa ao sentido lógico da tarefa de organizar argumentos explicativos diante do fato em si que é morrer. Ainda assim, tal evidência passa a habitar a consciência no absurdo da morte, na permanência do caminho humano na finitude. Desse modo, o poeta pergunta sobre o fato em si, fazendo-se autor de si mesmo no pensar que pensa o absurdo da morte:

Existe morte? Existe uma outra roupa
para cobrir a mesma e alvar nudez?
Uma coberta além? Qualquer estopa
para tapar o fundo que não vês?
[7]


Com isso, Nauro Machado, em “As Órbitas da Água”, adentra em uma filosofia da morte, no sentido de um questionamento radical sobre a mesma. A morte, por si só, constitui um fato da vida. Não apenas para o ser humano, mas todo e qualquer ser vivo. Tudo o que vive, um dia morrerá. Entretanto, ao contrário dos demais, o ser humano pode se perguntar sobre o sentido deste fato, enquanto discorre sobre o mesmo sobre o prisma de uma problematização, ao questionar: existe morte? A morte é uma realidade no tempo, por isso, pensar a morte é pensar também acerca do tempo.

2 - Nauro pensa o tempo

O tempo passa em fuga, o tempo passa na simplicidade das horas, e com ele sua lavoura despedaçando aquilo que plantamos no início da tempestade, que chega de modo inesperado na efemeridade da existência.

Para muitos, tempestade implica em bonança posterior. Para outros, em angústia profunda. O certo, porém, é que a tempestade da existência passa, seja qual for sua duração. O ser humano encontra-se neste intervalo, como num trajeto temporal em que figura como personagem protagonista, canalizando para o momento trágico da morte o desfecho inevitável para o sentido de sua vida, assim como fizera o Hamlet, de Shakespeare, no último de seus suspiros[8].

Nauro Machado escala a montanha do tempo, lendo a presença do humano nos passos em decomposição do ser que se encaminha para a morte. O tempo surge como a esfinge tebana a ser decifrada. Quem é o homem afinal? Como no caso do príncipe Édipo[9], o poeta lança a pergunta decisiva que quebra a passagem da existência apenas como ordem linear cronológica. O próprio poeta é consciente deste drama, ao assinalar:

Se para mim, ó tempo, sou o meu chão,
para outros seres, sonho de ilusão,
para outros seres, sou nenhum morrer:
para mim próprio, estranho e mudo,
ó tempo, como foi possível tudo?
como possível ser foi-me este ser?
[10]


Com isso, a efemeridade da existência é consumada pela presença do tempo. Mas, então, surge uma questão necessária: pensar sobre o tempo é o mesmo que sentir o tempo passando? Primeiramente, deve-se admitir que a tênue linha entre percepção e reflexão do tempo surge no horizonte da consciência. Por isso, o tempo apresentado por Nauro Machado, em “As Órbitas da Água”, constitui um drama, uma vez que implica na vivência da angústia, ou da medida existencial fadada a ter o tempo como morada. Martin Heidegger, em “Ser e Tempo”[11] usa a expressão “temporalidade”, que ilustra o modo como o homem toma esta questão em sua abrangência existencial.

Com efeito, é no calor das chamas interiores da alma que o tempo passa verdadeiramente. Nauro Machado é o poeta que se deixa atordoar pela angústia pensante do tempo e da morte. É o “outro ser” do poeta que clama:

Do fundo rio fundo um ser desvelo,
um monstruoso ser, que em vão me abraça.
(...)
dos dois que sou nenhum já sou, nem resta
de mim o meu no ser da alma que é minha!
[12]


Nada sobrevive ao drama da existência. A alma, tomada aqui como morada da angústia, vê-se esfacelada diante da radical pergunta que move o ser: “que sou diante do tempo que me conduz ao fato inexorável da morte?”. A alma do poeta, por isso, permanece apoiada na música dos contrapontos do tempo, e assim também será abandonada ao fixo transcurso da inexistência, como água que se evapora na panela escaldante das horas. A este drama clama o poeta em agonia:

Minha alma é rainha abandonada
à hora eterna da nefasta hora
em que a deitarei, ao pó desvirginada,
mais morta ainda do que a tenho agora.
(...)
a minha alma, que por dentro é pó e nada,
terá igual morte à que meu corpo é fora.
(...)
a minha alma cairá sobre ladeiras
- com boca e fala campo de frieiras –
cessando o sonho e morto o pesadelo.
[13]


Como estampa de um poder coercitivo, o tempo marca a impossibilidade de sua volta. A linha do tempo possui uma única direção, e o que passa é vivido apenas como lembrança, pois jamais retornará em sua singularidade.

Não volta mais o que vivido foi,
não volta mais o que se rememora.
(...)
não volta mais o que contudo dói
.[14]


Portanto, o agora é o caminho do tempo que se configura diante do Nada, abismo inefável à beira da morte. Ao ser humano cabe esta existência, na solidão de sua busca angustiada, e nela, a cuidar de sua morada poética, durante o percurso temporal que consuma no “exílio” de sua alma[15].

Resta no tempo a condição humana de ser para além do traço efêmero das horas que passam. Somente ao ser humano é dado este parto de dor, a dor do sentido, conquanto seja a morte a sombra do vazio que o atormenta durante o transcurso de sua existência. Todavia, a angústia do poeta[16] suspira como anseio ao chão duro da terra, ao olhar incessante diante da miséria da dor. Assim diz o poeta:

A angústia foi-me a agrura da agonia,
a angústia foi-me o ser que apedrejei.
Antes de louco fizesse-me o guia
da minha mente, que eu em mim não me sei
.[17].


Contudo, não se lança a porta da existência ao abandono, mas ao sentido de sua busca na trajetória temporal de si mesma, “nesta existência de ânsia e desespero”[18].


3 - A cidade e suas órbitas

O poeta encontra-se situado no tempo e no espaço de sua história citadina. É um ser situado, um ser histórico, um morador da ilha de São Luís, no Maranhão, em fins da década de 1970. Em seu processo perceptivo dos acontecimentos da existência de sua cidade, este ser faz poesia. Ele se chama Nauro Machado. Desde suas lembranças nos tempos de infância[19], até a maturidade de seus anos maduros nas ruas de sua pólis contemporânea. Ele é o ser que se move na poesia de sua cidade. Não a abandona em suas reflexões e em suas peregrinações cotidianas. Nauro não apenas habita em São Luís, mas tem uma relação de amor concreto com ela. Ele a pensa como inspiração de sua angústia diuturna.

Mas, como o poeta vê a cidade em que vive? Qual o olhar que recai sobre ela? Que impressão esta ilha de ruelas e sobrados causa ao poeta? Nos versos de “As Órbitas da Água”, a cidade é vista sob a solidão do poeta:

Morrerei cada vez mais solitário,
guardando o sonho, a dor, o Deus, as mágoas
.[20]


No espaço de sua percepção, o poeta vê uma cidade às seis da tarde[21], com o seu “povo alienado”, em mais um dia findado. Seu instante, porém, difere da constância de um ritmo previsível das calçadas. O tempo, em Nauro Machado, é o tempo da angústia[22]. O poeta caminha solitário como quem a tomar para si a indiferença do mundo, estampada na cidade contaminada pela “peste”[23] da cotidianidade, sem saber, porém, que está doente. A doença do supérfluo ater-se aos fenômenos do mundo, sem deles extrair um sentido. É o que se observa, ao ler-se:

Às seis da tarde, na estrada de ferro.
Solitariamente escuto o berro
saído mudo das bocas humanas
.[24]

No Soneto 49, observa-se outro exemplo que exprime o sentido do olhar poético sobre a cidade. Das pedras nas ruas, dos transeuntes perdidos, do cheiro pútrido das esquinas, tudo fala da cotidianidade percebida pelo poeta quem não apenas caminha, mas pensa seus passos situados no mundo.

A cidade encontra-se arruinada. Sua falência está no dia-a-dia mecânico de seus afazeres, mostrando a si mesma o caos de seu próprio abandono. Nauro Machado exprime a crueza de sua beleza, que agora é cinzenta, na passagem do tempo figurada na idade secular de seus muros e sobrados em decadência. Logo no início do Soneto 49, vemos o quanto isso é sintomático para o poeta, quando exclama:

Mostra a cidade à própria cidade!
Mostra a cidade, sua ruína e fama,
aos esplendores que o teu sexo invade
na imunda boca sobre imunda mama.


A relação sexual é metaforizada como amor do poeta a uma mulher amada, sofrida, e, ao mesmo tempo, odiada. A tormenta desta entrega revela a cama como tumba, lugar da excrescência mortal deste amor. É o que se lê, ainda no Soneto 49:

Abre-te toda! Mostra-nos tua idade:
trezentos e mais anos!, e derrama
- como mulher – tua cumplicidade
de quem se entrega, nua, à tumba-cama.


O concreto desta relação situa-se na incompletude, como um ato de amor a ser suprido ainda pelo homem. O gozo é efêmero, mas nada satisfaz o desejo voraz desta mulher na busca por satisfazer o ímpeto sexual. O poeta apenas deixa algumas marcas no caminho tortuoso desta jornada carnal. E continua no mesmo soneto:


Goza com ela, no teu orgasmo duplo,
o que de mim te falta e que não supro
multiplicado n vezes, em n´s.
Abre-te toda, mãe despossuída,
por mim levada no que a própria vida
desbaratou em pó, em feze, em pedra, em pênis.


4 - Deus nas águas de Nauro


A temática sobre Deus é um dos pontos centrais da obra poética de Nauro Machado. Em “As Órbitas da Água”, tal preocupação surge como uma de suas principais idéias. O alheio do ser encontra em Deus um eixo de fecunda relação com o humano, oposto a toda regra de norma ou doutrina. Este Deus habita no porão da angústia humana, no Nada da existência conduzida pelo drama do ser. As águas de Deus conduzem o homem ao abismo de sua consciência em conflito. Ele “vai me levando ao outro lado, por me / teres feito de nada, Tu, o alheio extremo”[25].

Fecunda é assim a idéia de Deus, a mastigar a essência humana de sentido, pela angústia que lhe é cara. O poeta rumina Deus, em seu vale de angústia. A sua relação fere a teologia tradicional do ser absoluto que vê o homem de cima, em algum céu distante e pré-julgatório. Ao contrário, Deus é o próprio alimento diário do poeta:

Mastigo tanto o espírito!, e sei o credo
Deus, espinafre podre a ensandecer
- na estrela-víscera – o cio em Deus Pai ...”
[26]


Com isso, a partir deste ponto, vê-se que é na fecunda expressão da palavra que o humano se reencontra com Deus, sabendo-se na finitude que concebe o eu na dimensão do divino: “eu, o Senhor de mim, verbo assinalado”[27].Com efeito, Deus surge como um tecido a ser construído pelas mãos diligentes do alfaiate-homem, no aqui temporal de sua angústia, de seus impasses, de suas fornalhas ardentes, como diria o romancista russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881).

Para o poeta, falar a respeito de Deus é uma de suas maiores tormentas. Esta imagem ganha um espaço fundamental na vasta obra poética de Nauro Machado. Ele mesmo diz a esse respeito que Deus:

É o círculo cujo centro está em todas as partes e o ponto terminal no fim de todo início; exceto a possibilidade de vê-Lo, de cheirá-Lo, Deus é o desafio encarnado de um Verbo no espaço cego da mutez mais vasta na boca do Nada que se anseia às portas do Tudo.[28]


Por isso, esse traço existencial de Deus, pela palavra, ressoa como um dos elementos de maior relevância na obra do poeta maranhense. Em “As Órbitas da Água”, especificamente, Deus encontra-se no drama do mundo, como “Deus-mundo”, “Deus-fruto”[29], no espaço fecundo de um eterno voltar-se a Deus, ainda que persistam na terra o silêncio, as dúvidas e o vazio repetido pela palavra angustiada da existência:

Dói demais o muito do Teu opaco,
a Tua transparência tão nenhuma,
Senhor rasgado, qual cosido saco
do todo inteiro em arruinada ruma
.[30]


A melodia da música divina depara-se com o Nada[31], isto é, com a ausência absoluta de sentido, sobretudo diante da finitude humana, na presença da morte. Nada mais duro que as pedras que falam e “batem na minha esperança”, “para fazer-me Deus de um outro eterno”[32]. Deste rogar, à guisa de uma súplica existencial, brotam as pedras da angústia e da morte, que, finalmente, conduzem o poeta ao Paraíso Perdido de si mesmo.

Contudo, “toda uma idéia é um mar em Deus imerso”[33], o que conduz a existência ao ponto nevrálgico das águas atormentadas pela pedra de Deus. Esta pedra figura como as águas da existência, que o poeta percebe em movimento centrífugo. É de lá que surge o conteúdo para a expressão de sua morada originária, que é a palavra como momento único, jamais repetido, isto é, o tempo singular da mortal fala humana acerca do divino. É neste âmbito que o poeta existe, na ambiência do sagrado, pois se sabe como portador de um olhar efêmero, mas raro:

enquanto o tempo já fatal me míngua,
cuido da alvenaria de Deus na língua,
na mesma dor do fim que somos ambos
.[34]


Em seu aspecto único, paira a poesia de Nauro Machado na sublime “sensação de Deus”[35], como a exprimir, como ser existente, toda solidão, crueza, beleza e sentido de uma palavra que se desespera de si, na contemplação faminta do humano em curso para a morte, desde “a anca do túmulo à altura de Deus, este tamanho de coisa acabada”[36].

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim resplandece a poética de Nauro Machado, em “As Órbitas da Água”, no padecimento da existência como angústia, gerando a consciência atormentada de que, mesmo enquanto seres finitos, rompemos a lacuna da morte, ao descobrirmos o espaço poético na alma, conflitada pela presença meta-física de Deus.


BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

MACHADO, Nauro. As Órbitas da Água (sonetos) – Prêmio “Sousândrade” – Cidade de São Luís, 1979.

LEÃO, Ricardo. Tradição e Ruptura: a lírica moderna de Nauro Machado. São Luís: Fundação Cultural do Maranhão, 2002.

LOBATO, Maria de Nazaré Cassas de Lima. A Revelação de Nauro Machado. São Luís: EDUFMA, 1987.

HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo – Parte II. 3 ed. Tradução de Márcia de Sá Cavalcante. Petrópolis, RJ: Vozes, 1993.

SHAKESPEARE, William. Hamlet. Coleção Obra Prima de cada Autor. São Paulo: Martin Claret, 2003.

SÓFOCLES. Édipo Rei. Coleção Obra Prima de cada Autor. São Paulo: Martin Claret, 2003.


[1] Obra vencedora do Prêmio “Sousândrade” – Cidade de São Luís, em 1979.
[2] Cf. Ser e Tempo, 2ª Seção, ∫ 53 , pp. 43-51.
[3] Cf. 2ª Seção, ∫ 45, p. 11.
[4] O termo “problema”, tomado a partir de uma abordagem filosófica, é tudo aquilo que exige uma solução por meio da racionalidade humana.
[5] Cf. As Órbitas da Água, Soneto 7.
[6] Idem, Soneto 8.
[7] Ibidem, Soneto 12.
[8] Cf. Hamlet, Ato 5.
[9] Cf. Édipo Rei, de Sófocles.
[10] Cf. As Órbitas da Água, Soneto 13.
[11] Cf. Ser e Tempo, 2ª Seção, ∫ 45, pp. 13-14.
[12] Cf. As Órbitas da Água, Soneto 16.
[13] Idem, Soneto 17.
[14] Cf. Idem, Soneto 23.
[15] Ibidem, Soneto 28.
[16] Ibidem, Soneto 74.
[17] Ibidem, Soneto 41.
[18] Ibidem, Soneto 40.
[19] Cf. As Órbitas da Água, no final do Soneto 9.
[20] Cf. Idem, Soneto 46.
[21] Ibidem, Soneto 47.
[22] Idem.
[23] Cf. Op. cit, Soneto 46.
[24] Idem, Soneto 47.
[25] Cf. As Órbitas da Água, Soneto 6.
[26] Idem, Soneto 9.
[27] Ibidem, Soneto 10.
[28] Cf. DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DO MARANHÃO, Ano LXXIX, Edição especial, nº 06, São Luís, Maranhão, Agosto de 1986, p. 52-53, apud: LEÃO, Ricardo. Tradição e Ruptura: a lírica moderna de Nauro Machado, São Luís: Fundação Cultural do Maranhão, 2002, p.130-131.
[29] Cf. As Órbitas da Água, Soneto 21.
[30] Idem, Soneto 22.
[31] É significativa a metáfora utilizada pelo poeta para ilustrar a relação entre o Nada e Deus, no final do Soneto 24, quando o poeta assinala: “Ó treva póstuma do outro caminho: / amanhecendo está, devagarinho, / dormindo o nada e Deus na mesma cama”.
[32] Cf. As Órbitas da Água, Soneto 53.
[33] Idem, Soneto 55.
[34] Cf. As Órbitas da Água, Soneto 82.
[35] Idem, Soneto 86.
[36] Idem, Soneto 75.

Artigo: Perspectivas Metodológicas sobre o Ensino de Filosofia no CEFET-MA

PERSPECTIVAS METODOLÓGICAS SOBRE O ENSINO DE FILOSOFIA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NO CEFET-MA

Jorge Antônio Soares Leão[1]

RESUMO:

O presente projeto, intitulado “Filosofia com Arte no Ensino Médio”, consiste em uma pesquisa sobre a relação entre filosofia e arte, nas atividades do ensino da disciplina de filosofia para estudantes da segunda série do ensino médio, turno vespertino, do Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão. O projeto é realizado por meio de um convênio interinstitucional com a Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão – FAPEMA – e seu foco de atenção delimita-se à questão da metodologia de ensino de filosofia no ensino médio, e o debate e socialização desta experiência em outras escolas que oferecem a disciplina de Filosofia em sua grade curricular.

Palavras-chave: Filosofia, Arte, Ensino, Metodologia, Ensino Médio


1 – A filosofia e seu ensino em diálogo com a arte

A filosofia constitui o saber pensar pelas causas, buscando os fundamentos da existência, cuja proposta última desemboca na realização integral do ser humano. Entretanto, no contexto específico da escola, observa-se que o ensino da filosofia, como uma disciplina curricular, ainda encontra-se vinculado a um esquema de temas e abordagens fixos na rigidez de aulas desmotivantes, sem qualquer relação com o dia-a-dia dos estudantes.

Por isso, este projeto de pesquisa pretende estimular professores e estudantes de filosofia a pensar juntos uma metodologia de ensino que se aproxime das questões essenciais da existência humana, sem que para isso tenhamos que distanciar os conteúdos filosóficos de seus ouvintes, por meio de uma linguagem hermética e descontextualizada da história vivida de cada participante da aula.

Este diagnóstico nos convida a pensar uma maneira de ensinar filosofia a partir da sensibilidade do estudante entendido com ser pensante, e concentrando o foco de seu objetivo na aproximação entre dois saberes tidos como inúteis, no contexto social, capitalista e pragmático, em que nos situamos. Sabe-se, contudo, que a filosofia e a arte possuem uma tarefa substantiva para a formação educacional do ser humano, pois seus processos de aprendizagem ultrapassam a mera fixidez de respostas prontas e acabadas, que muitas vezes inibem no jovem o despertar para o pensar e levantar questões a respeito de sua vida, a partir do que é transmitido pela escola. Por isso, vê-se a importância de desenvolver projetos de pesquisa que contemplem o ensino de filosofia a partir de uma experiência significativa para professores e estudantes.

Como é sabido, as imagens construídas pela sociedade do filósofo e do artista quase sempre estão envoltas em uma teia estereotipada de preconceitos. Dizer coisas que ninguém entende ou criar obras de arte com símbolos incompreensíveis são os elementos presentes na impressão imediata de quem lê um texto de filosofia ou visita uma exposição de arte. Entretanto, qual seria então o motivo de um tratamento como este?

Vive-se no tempo das relações velozes, em que tudo adquire mais ou menos importância se pode ser negociado pelas cotações econômicas do mercado. O próprio conceito de utilidade vincula-se à idéia de produtividade. Assim, ler um texto de Platão ou apreciar uma sinfonia de Mozart não levaria ninguém a nada, uma vez que suas tarefas estariam desprovidas de funcionalidade. Nesse sentido, uma bicicleta é mais “útil” que um compositor da música erudita ou um texto clássico de filosofia.

Então, surge a pergunta: qual a importância da filosofia e da arte, posto que não possuem utilidade imediata? Ora, pelo fato de alguma coisa não ser útil como um objeto dado, isso não quer dizer que tal coisa não seja necessária para a existência humana. “Nem tudo que parece ser inútil é desnecessário” (FEITOSA, 2004, p. 25). Por isso, pensamos que aproximar o olhar do filósofo à sensibilidade do artista conduz a uma possibilidade de compreender com maior profundidade o drama humano no mundo, repleto de valores, sonhos, idéias e utopias, mas também de fracassos, tristeza, conflitos e indiferença. Desse modo, conforme a análise de Charles Feitosa, em seu texto “Explicando a Filosofia com Arte”:

a parceria entre a filosofia e a arte torna possível tratar com alegria e leveza alguns temas importantes e complexos da cultura e da existência, tais como o sentido da realidade, o lugar da ciência na sociedade, as interpretações do corpo e da natureza, a relação entre arte e verdade, a transitoriedade do amor e a inevitabilidade da morte. (FEITOSA, 2004, p. 8)


Assim, a estima, a admiração e o respeito pela busca do sentido da existência podem transformar-se num momento de encontro de amigos e de intensa riqueza poética. Ainda que estejamos vivenciando momentos de distanciamento e indiferença em relação ao fazer pedagógico no contexto da escola pública brasileira, pensamos ser este projeto de pesquisa um compromisso social e político com a dinâmica existencial de nossos sonhos e utopias, a partir de um olhar crítico e de uma sensibilidade estética, que se renovam a cada novo abrir das cortinas para o início de mais um espetáculo, que devem ser as aulas de filosofia. Foram estes elementos que nos exigiram uma abordagem metodológica participativa e investigativa, contribuindo decisivamente para a constante melhoria na dinâmica das aulas e no próprio enfoque que se quer apresentar ao ensino de filosofia.

3 – O desenvolvimento do ensino de filosofia por meio da pesquisa

O ensino de filosofia precisa vincular-se ao contexto do estudante, no caso aqui a realidade do Ensino Médio. A partir deste pressuposto, vê-se o quanto o desenvolvimento de um projeto de pesquisa pode favorecer uma experiência significativa com o processo pedagógico em sala de aula. Desse modo, surgiu o projeto “Filosofia com Arte no Ensino Médio”, com o propósito de alcançar os seguintes objetivos:

- Promover um diálogo enriquecedor entre filosofia e arte, por meio de uma metodologia de ensino de filosofia significativa, investigativa e dinâmica;

- Estimular professores e estudantes de filosofia a pensar juntos uma metodologia de ensino que apresente os conteúdos filosóficos de modo significativo diante do contexto vivido pelos estudantes do ensino médio;

- Elevar o olhar do estudante do plano imediato das normas, fatos, leis e dados para o caminho da descoberta filosófica, a partir do diálogo entre os conteúdos de filosofia e as diversas linguagens e manifestações artísticas.

Vale ressaltar, que, para o pleno desenvolvimento de um projeto de iniciação científica, será necessário o total envolvimento do professor, que deve assumir a postura de um orientador criterioso, inserido no acompanhamento do cronograma, e situado na relação estabelecida entre a pesquisa e o contexto da sala de aula, isto é, ponderando e avaliando constantemente os passos propostos quando da elaboração do projeto de pesquisa. Por isso, fez-se necessária a prática de encontros semanais com os estudantes bolsistas, em grupos de estudos, onde foram debatidos e aprofundados os temas da pesquisa, assim como percebidos os fatores que possivelmente pudessem inibir o bom andamento da mesma.


4 – A contextualização da experiência no CEFET-MA

O Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão – CEFET-MA - é uma instituição da rede federal de ensino, de caráter híbrido, tendo em seu âmbito interno realidades de ensino médio, ensino médio integrado ao ensino técnico, ensino técnico-profissionalizante e ensino superior. Diante desta multiplicidade de experiências, várias são as diferenças, desde o projeto pedagógico de cada curso oferecido, até as dificuldades de um planejamento interdisciplinar, diante da estrutura organizacional da escola.

A realidade sócio-econômico-cultural também é diversa, com alguns alunos situados em condições boas a nível sócio-econômico e outros sem grandes recursos financeiros, exigindo dos professores um profundo conhecimento dessa realidade, a fim de contextualizar suas disciplinas com tais elementos sociológicos. Os alunos bolsistas do projeto “Filosofia com Arte no Ensino Médio” são alunos sem grandes condições econômicas, o que em momento algum vem dificultando a participação dos mesmos na realização das atividades da pesquisa, pois se observa grande interesse e responsabilidade por parte de todos.

Assim, as atividades foram iniciadas, partindo do enfoque de leitura de textos direcionados para as temáticas envolvendo a metodologia do ensino de filosofia e sua articulação possível com as linguagens de arte. Após o estudo introdutório sobre filosofia da arte, seguido das visitas a centros culturais e apresentações artísticas, e apresentação de relatórios críticos sobre cada apresentação, os alunos bolsistas puderam escolher uma linguagem de arte que mais se identificavam (literatura, música, cinema, teatro, artes plásticas, etc.), e relacionar com os conteúdos de filosofia, a fim de perceberem como a arte, em suas múltiplas possibilidades de expressão, pode contribuir para dinamizar as aulas de filosofia.

Desse modo, cada observação correspondeu a uma abordagem metodológica, em sintonia direta com a dinâmica das aulas, propondo os alunos pesquisadores sugestões ao professor, para o enriquecimento da metodologia de ensino de filosofia. Com as sugestões, o professor analisa conjuntamente com os alunos os elementos a serem encaminhados para o plano pedagógico de sua escola. Após esta coleta de dados, foi concluída a pesquisa, servindo de base para o resultado final do projeto, com a elaboração de artigos do professor e dos alunos bolsistas, para serem socializados para toda a realidade da escola. Este deve ser o momento culminante do projeto, por meio da socialização da pesquisa desenvolvida.

Desse modo, enquanto atividade pedagógica direcionada para a pesquisa, centrada no problema da metodologia do ensino de filosofia, este projeto vincula-se à necessidade do desenvolvimento de atividades centradas em dois momentos principais, a saber: uma pesquisa bibliográfica e uma pesquisa de campo. O levantamento bibliográfico, o fichamento e a leitura filosófica dos textos foram realizadas durante o período de outubro de 2006 a outubro de 2007, pelo convênio PiBiC – Jr, em parceria do CEFET-MA com a Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão – FAPEMA – juntamente com visitas a centros culturais e eventos artísticos, onde os alunos bolsistas elaboraram relatórios de pesquisa, a fim de relacionar as linguagens de arte estudadas – música, literatura, teatro, cinema, dança e artes plásticas – com os conteúdos filosóficos trabalhados em sala.

5 – Avaliação dos resultados da pesquisa

Com o desenvolvimento da pesquisa, foi possível observar os seguintes resultados:

- Descoberta da importância da arte como elemento de interlocução com o saber filosófico, enquanto situado em sua prática de ensino.

- Que os conteúdos de filosofia podem levar a uma reflexão crítica das imagens e manifestações artísticas em seus mais variados campos de atuação, assim como a expressão e apreciação estéticas podem conduzir o estudante de filosofia a um processo de elaboração conceitual motivado pela sensibilidade artística, enquanto condutora instigante da tarefa do pensar filosófico.

- Percepção da necessidade de uma metodologia de ensino de filosofia mais próxima do contexto vivido pelos estudantes do ensino médio.

- Mudança a partir do olhar do estudante no modo de entender o papel da escola no mundo de hoje, saindo do mero plano imediato das fórmulas, registros, arquivos, informações e dados do passado para o caminho da descoberta investigativa e da reflexão filosófica, a partir do diálogo entre filosofia e arte.

6 – Considerações finais

A previsão é de que o projeto possa ser continuado no CEFET-MA, como atividade acadêmica que se propõe a pensar o ensino da filosofia na escola. Ampliar esta idéia deve ser, portanto, uma prioridade, a fim de que outras escolas e professores possam tomar conhecimento deste projeto e contribuírem para a melhoria e aperfeiçoamento do mesmo. Por meio de seminários, encontros, mostras cientificas de ciência e tecnologia, cafés filosóficos e outros meios de divulgação, pode-se motivar outros colegas professores a desenvolverem experiências similares, com a elaboração de projetos de pesquisa que visem à autonomia intelectual de nossos jovens estudantes. Entendemos ser possível este caminho tanto para a filosofia, quanto para as demais disciplinas curriculares do ensino médio, inclusive permitindo outros meios de ingresso às universidades, que não o vestibular, muitas vezes reducionista e distante da autonomia intelectual pretendida pela filosofia e pelo conhecimento científico, a fim de levar em consideração experiências de projeto de pesquisa na realidade do ensino médio, pois o perfil de um estudante pesquisador, crítico, reflexivo e atuante é o que se propõe para as escolas, para as universidades e para o conjunto de nossa sociedade.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, Dalton José. A filosofia no ensino médio – ambigüidades e contradições da LDB. Campinas, SP: Autores Associados, 2002.

ARANTES, Paulo... et all ; MUCHAIL, Salma T. (org.). Filosofia e seu ensino. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes; São Paulo: EDUC, 1995.

CHAUÍ, Marilena. Filosofia – Série Brasil, Ensino Médio – Volume Único. São Paulo: Ática, 2005.

COLI, Jorge. O que é Arte. Coleção “Primeiros Passos”. São Paulo: Brasiliense, 2005.

DELEUZE, Gilles; GUATARRI, Félix. O que é a filosofia? Tradução: Bento Prado Jr. E Alberto Alonso Muñoz. São Paulo: Editora 34, 1997.

FEITOSA, Charles. Explicando a Filosofia com Arte. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

FOSCHEILD, Dominique e WUNENBURGER, Jean-Jacques. Metodologia Filosófica. Tradução Paulo Neves. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

GALLO, Silvio; KOHAN, Walter Omar (orgs.). Filosofia no ensino médio. Vol. VI. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

KOHAN, Walter (org.). Ensino de filosofia: perspectivas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002, 296p.

LIPMAN, Mathew; SHARP, Ann Margaret; OSCANYAN, Frederick S. A Filosofia na Sala de Aula. Tradução: Ana Luiza Fernandes Falcone. São Paulo: Nova Alexandria, 2001.


NUNES, Benedito. Introdução à Filosofia da Arte. São Paulo: Buriti, 1966.


[1] Professor de Filosofia do Ensino Médio no CEFET-MA.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Agora é lei: A Filosofia e a Sociologia no Ensino Médio

Agora é lei: a Filosofia e a Sociologia no Ensino Médio das escolas brasileiras

Finalmente a lei que obriga o ensino de Filosofia e Sociologia em todas as séries do ensino médio no Brasil foi aprovada no último dia 2 de junho. O Congresso Nacional alterou o artigo 36 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996. O projeto de lei n. 1641/2003, do deputado Ribamar Alves (PSB-MA), foi primeiramente aprovado na Câmara dos Deputados, e posteriormente, no dia 8 de maio deste ano, no Senado Federal. Espera-se agora que os professores destas disciplinas tenham suas vagas garantidas por meio de concursos públicos.

Por isso, faz-se necessário mobilizar as secretarias estaduais e municipais de educação nesta luta. A importância de inserir Filosofia e Sociologia no ensino básico é inquestionável. Mas não é suficiente tê-las no currículo, é preciso um esforço contínuo de formação para os professores, a fim de que haja de fato um ensino de qualidade para os nossos estudantes. Por isso, é também fundamental a atuação conjunta com os departamentos de Filosofia e de Sociologia de nossas universidades.

Uma outra mobilização necessária neste momento histórico é organizar núcleos de pesquisa sobre o ensino de Filosofia e Sociologia. Os desafios encontrados nas escolas brasileiras são de ordem variada e complexa. Vários problemas acompanham o dia-a-dia dos professores. Além de estruturas físicas muitas vezes depauperadas, sobretudo na rede pública de ensino, observa-se a falta de preparo de muitos professores, além de permanente ausência de compromisso ético com o ensino, não somente de Filosofia e Sociologia.

Assim como as universidades, que formam profissionais para a licenciatura em Filosofia e Sociologia, precisam oferecer cursos de formação continuada, nos aspectos fundamentais do ensino, tais como: planejamento, conteúdos, metodologia, avaliação e estrutura curricular. Desconsiderar a formação educacional de nossos professores é prejudicar em suas bases o processo de inserção da Filosofia e da Sociologia nas escolas brasileiras. De fato, não adianta muita coisa ter um diploma de graduação, e não estar em permanente estado de formação. E isso a universidade pode e deve fazer, basta oferecer cursos regulares de formação continuada para professores. Assim também como as secretarias municipais e estaduais de educação devem assumir este compromisso.

Não podemos parar de pressionar também a nós mesmos, professores, para que a cada dia o ensino filosófico e sociológico constituam pilares da formação cidadã de nossa juventude. Entendendo que estas disciplinas são garantia de uma responsabilidade ética, na construção de um mundo mais justo e fraterno para todos, a começar pelas crianças. Além de considerar que tais horizontes não se colocam repentinamente, sem o cuidado lento e gradual no contato direto com bons livros, boas bibliotecas, equipes de planejamento interdisciplinar, núcleos de pesquisa integrados, o bom uso em sala de aula dos recursos multimídia e, acima de tudo, a contextualizaçã o dos conteúdos com a realidade concreta da vida dos estudantes.

Portanto, que esta lei possa garantir que as novas gerações sejam de fato conscientizadas de sua importância para a habitação de um mundo em que filósofos e sociólogos sejam muito mais que repassadores de informações do passado, mas agentes vivos de um pensamento que aponta para um futuro melhor, pois finca seus pés no presente, tendo como alicerce aquilo que de mais importante nos legou o passado, a nossa herança cultural. Que também esta lei não se torne no Brasil palavra morta.

Jorge Leão
Professor de Filosofia do CEFET-MA e membro do MOVIMENTO FAMILIAR CRISTÃO.

Avaliação das aulas de Filosofia pelos alunos do CEFET-MA

cAROS AMIGOS,
aí estão alguns relatos dos alunos do 3º ano do Ensino Médio do CEFET-MA - Ano de 2007
Avaliação final da disciplina, do professor e dos alunos de filosofia

Turma 304

“... você repassou bem seus conhecimentos da disciplina, em momento algum você fugiu do assunto. Suas aulas eram bem criativas, isto é, no sentido que todos pudessem entender.
Se não fosse a sua maneira de ensinar, até hoje eu odiaria filosofia. Você fez com que os alunos entendessem a disciplina, simplesmente de uma maneira mais dinâmica.”
“... eu não ligava pra filosofia, era apenas mais uma disciplina pra me atrapalhar, como eu tava enganada. Aprendi muito com todos os assuntos, tirei muita coisa boa, a cada assunto eu tirava algo pra minha vida.” – Siloni Alves

“a disciplina foi trabalhada de um modo bastante diversificado, abrangendo várias áreas, todas com muita relação com a filosofia, de uma maneira ou de outra, com variados métodos de trabalho, desde o debate junto à turma até a apresentação de vídeos.
Ela foi passada de maneira compreensiva, poucas foram as vezes que eu me senti um pouco confuso nos temas abordados, e ainda o que é bom, surgimento de várias dúvidas, porque é assim que se desenvolve, com análise e questionamento a cada argumento que nos é passado.” Ivo Thomas Froes Cruz

“O estudo de filosofia durante esses dois anos no CEFET teve, para mim, uma importância indiscutível. Através dos problemas trabalhados, pude organizar meus valores pessoais e até mesmo, aprender mais sobre eles. Todos os temas, sem diferença, me ajudaram de alguma forma. Matrix, política, ética, linguagem, antropologia, Prometeu acorrentado, entre outros deixaram uma marca e uma aprendizagem na minha vida, contribuindo efetivamente para minha formação.” Raíla Silva Maciel

“As aulas de filosofia são maravilhosas. As melhores que já tive, porque são sempre contextualizadas, dinâmicas, fazendo com que nos chame a atenção para os temas abordados.
... o professor soube chamar atenção, impor respeito sem se tornar autoritário. (...) soube explorar os assuntos, envolver os alunos.” Nadejda Silva Ferres

“neste semestre pude notar novamente que é uma disciplina indispensável no currículo escolar, pois estimula o raciocínio. Nas aulas é inevitável adotar um ponto de vista e ter pelo menos um argumento sobre. O que revela sua importância.
O professor soube estimular o raciocínio. Aulas expositivas? Jamais, sempre em debates, fazendo com que nós aprendêssemos a argumentar e defender nosso ponto de vista. O que é, ao meu ver, o objetivo da disciplina.” Bruno Pontes Quintanilha

Turma 302

“Sempre gostei das aulas de filosofia. Tudo foi válido. Os textos, debates e os trabalhos foram riquíssimos, o que demonstrou que, realmente, o objetivo das aulas foi alcançado: tornar os alunos seres pensantes, críticos e humanizados.
(...)
Parando um pouco e percebendo que dois anos se passaram, vejo que aprendi muito e, mesmo que às vezes eu não saiba o que eu quero ser, hoje, sei o que não quero para minha vida com mais confiança. A filosofia me possibilitou pensar que sou responsável por aquilo que cativo, que é preciso dar o devido valor à ética, política e minha liberdade. E ter sempre o desejo de buscar o conhecimento.” Dayanna Gomes Santos

“No ano que se passou pude aprender coisas que me serviram como lição e que, com certeza, vou levar comigo para o resto de minha vida. Coisa de fundamental importância foram ensinadas durante o ano, como o amor à vida, o amor ao próximo e também o amor a nós mesmos, que é o mais importante para se alcançar o autoconhecimento.” Willyson Araújo

“Filosofia é uma porta para todos os conhecimentos, inclusive o autoconhecimento. Aprender sobre filosofia me ajudou em leitura e interpretação. (...) Não tenho muito o que citar como negativo, de repente, talvez, faltou apenas um passeio “filosófico didático”. “ Dillfrancy Espíndola dos Santos

“Assim como no ano de 2006, o de 2007 não foi diferente, tivemos aulas de filosofia muito boas, com a análise de textos, apresentações de trabalhos e principalmente a análise de uma obra excelente: “A última grande lição”, de Mitch Albom, que nos mostrou uma bela lição de vida, perseverança e amor. Além disso, assistimos a filmes que nos proporcionaram uma melhor aprendizagem do tema estudado. (...)
Pude aprender significativamente os aspectos abordados em sala de aula, o que propiciou uma melhor visão crítica do social e um crescimento quanto ser humano, especialmente quando tive a oportunidade de ler “A última grande lição”.”

Luanna Lopes Padilha

Turma 301

“... poderíamos ter mais da História da Filosofia, mas para isso precisaríamos de mais tempo. Apesar disso, a matéria foi muito bem trabalhada, na medida do possível. O mais importante foi visto: a base para entendermos de fato a filosofia e agir como seres pensantes. Dessa forma analisaremos melhor os textos filosóficos, percebendo e criticando a realidade à nossa volta.”
Jorge Araújo Martins Filho

“... acredito que a matéria foi dada da maneira mais fácil de ser entendida, com textos, debates, músicas, enfim, nos passando situações do cotidiano em que poderemos compreender o assunto trabalhado e não uma forma decorativa de aprender um conteúdo que cairá no vestibular.
(...) acredito que você foi o único professor com que eu tive contato diretamente em termos pessoais, fora da sala de aula. Queria agradecer por ter me ajudado em todos os sentidos, em tentar me ajudar a compreender o assunto, a ser mais maduro em diferentes situações... Apesar do momento de crise nos primeiros momentos de convívio da nossa turma para com você, acredito que todos os alunos (sem exceção) falarão quase a mesma coisa que estou falando e até melhor. (...) Obrigado por tudo!”
Ueider Moraes Rego da Silva Júnior