quarta-feira, 1 de julho de 2009

Formar, informar, deformar...

Uma reflexão sobre a formação de nossos professores de filosofia.
Abraços fraternos,
Jorge Leão

Formar, informar, deformar...

No âmbito educacional, a filosofia encontra o desafio de formar o ser humano em sua integral perspectiva. No entanto, a realidade pedagógica em que nos situamos, traz desafios que impedem a concreta efetivação deste processo.

Primeiro, no aspecto de nossos cursos regulares de filosofia, de um modo geral, o aspecto informativo (as diversas doutrinas, sistemas e teorias da história da filosofia) se sobrepõe ao elemento formador, enquanto processo de diálogo permanente com os problemas levantados e sua amplitude contextual, sobretudo às vivências e inferências do leitor, aprendiz, educando...

Da retomada dos assuntos apresentados no período em que nos “formamos” ao encontro com os alunos em sala de aula, novas lacunas se abrem, não apenas pela deficiência de informações ao longo de nossa frágil formação, mas na completa ausência de ligação entre os dados históricos e o cenário concreto da escola em que se encontram os professores de filosofia.

A experiência filosófica implica em possibilidades que nos remetem à questão: por que ensinar filosofia? A relação, desse modo, é de um profundo significado político, existencial e estético. Ora, se a informação não possibilita uma reformulação de nosso código lingüístico academicista, então toda a estratégia de se inserir a filosofia como disciplina curricular encontra-se esvaziada.É assim que nos colocamos diante da informação que recebemos e da que iremos transmitir.

Enquanto professores, não podemos confundir as instâncias do saber, mediado pelo pensamento vivo na experiência do ensino, com as estruturas massificadas do repasse burocrático de uma informação destituída de sentido, o que seria apenas perder de vista a unidade entre saber e ressignificar a história da filosofia por meio de sua inserção na realidade da sala de aula.

Retomando o conceito de práxis, a mediação do pensamento com a realidade cotidiana e vivencial torna-se elemento fundamental do ensino, enquanto formação básica do professor. A tarefa está, pois, em redimensionar o ensino tendo como eixo orientador a crítica auto-avaliativa da ação pedagógica, posto que “a reflexão crítica adquire sentido ao transformar-se em práxis” (GHEDIN, 2008).

Assim, retomamos aspectos considerados básicos para a formação do professor de filosofia, a saber: o que ensinar em filosofia? Isto é, qual é a especificidade do conhecimento filosófico? Em que sentido esse conhecimento contribui para a formação humana?

Outro elemento que deve figurar com clareza a perspectiva pedagógica do professor de filosofia é sobre por que ensinar filosofia? O que nos motiva como professores ao processo de ensino? Neste âmbito, reconhecemos tocar uma questão polêmica, e, ao mesmo tempo, crucial, haja vista a ausência de elementos claros sobre as razões de a filosofia estar ou não assumindo uma condição de disciplina no currículo do ensino médio brasileiro.

A academia ainda encontra-se, muitas vezes, fechada em sua proposta curricular, inclusive quando se oferta cursos de licenciatura em que a produção de debates sobre o tema encontra-se sufocado pela postura enciclopedista, delimitada, como se sabe, ao âmbito da história da filosofia.

Direcionado ao trabalho do professor na escola, um curso de formação de professores de filosofia deve necessariamente saber qual a realidade do ensino médio brasileiro. A completa distância e por conseqüência o afastamento da escola levam o estudante de filosofia a não saber, de fato, para quem ele vai falar. Assim, os mais terríveis absurdos metodológicos são realizados em sala de aula, por conta de um completo desconhecimento sobre a teoria da aprendizagem, o processo de conhecimento e a psicologia da adolescência, que deveriam constar em nossos cursos de licenciatura em filosofia.

Por isso, como ensinar a filosofia para o público do ensino médio, se não houve o preparo teórico, a fim de estabelecer critérios epistemológicos, éticos e didáticos para o desempenho da relação do professor em sala de aula? O desafio é presente no aspecto de que, caso não ocorra o cuidado específico com a mediação da palavra e do processo de ensino, o professor de filosofia trará para a escola a deformação da problemática do ensino filosófico, pois fatalmente cairá no hermetismo conceitual ou no ativismo das habilidades e competências, destituído de fundamentação e do trabalho dos conteúdos filosóficos necessários para o ensino médio.

Assim, o que cabe à formação de um professor de filosofia? Esta pergunta diz respeito ao problema central que se impõe a todos nós, ou seja, qual é, na verdade, o papel da filosofia na sociedade contemporânea? Investigar o cerne desta questão constitui descortinar o papel social do professor, enquanto elemento político de fundamental importância para a construção de um espaço de produção de conhecimento, que deve ser a escola.

O debate entre os grupos de professores na academia sobre o ensino e a sua conseqüente reflexão e autocrítica promove o fortalecimento da prática reflexiva em filosofia. Por isso, é necessário priorizar o entendimento de uma formação em processo de construção permanente, em que a história da filosofia, o programa a ser pensado, a concepção de avaliação, os aspectos metodológicos, traduzam, mediante uma práxis transformadora, o papel de nosso agir enquanto professores de filosofia.

Que filosofia? Que formação? Apenas informação, sem formação problematizadora, poderá nos conduzir a uma deformação de nossos estudantes, futuros professores e dos alunos que receberão os impactos desta “filosofia”, formando, informando ou deformando...


REFERÊNCIAS

- GHEDIN, Evandro. Ensino de Filosofia no Ensino Médio. SP: Cortez, 2008.

- VASQUEZ, Adolfo S. Filosofia da práxis. RJ: Paz e Terra, 1991.

Um comentário:

Gabriel Hislla disse...

http://marblesastronaut.blogspot.com/2009/08/3-do-plural.html
Paranóico e nada em comum com o assunto, mais gostaria de saber sua opnião.