terça-feira, 30 de setembro de 2008

Comentários sobre o filme "The Matrix"

Amigos, um texto sobre filosofia no filme "The Matrix", até o próximo encontro...
Jorge Leão

Comentários sobre o filme The Matrix

O projeto trabalhado em sala de aula, desde o ano de 2004, vem dando resultados interessantes e suscitando trabalhos muito bons e debates calorosos entre os estudantes, ele se chama SÓCRATES, MATRIX E A FILOSOFIA, e visa estabelecer uma relação entre os temas abordados pelo filme "The Matrix" (1999), dirigido pelos irmãos Andy e Larry Wachowski, e os conceitos fundamentais do pensamento socrático, sobretudo o auto-conhecimento e o drama da liberdade. Outro elemento textual importante utilizado foi o mito da caverna, de Platão (Cf. A República, livro VII). Neste item, o professor pode trabalhar o papel da filosofia no mundo, como elemento reflexivo, capaz de situar o ser humano como uma espécie de retrato ou cópia de modelos que não estão contidos nas sombras do imediatismo cotidiano. O debate poderá ser estabelecido a partir da inauguração da democracia ateniense, e Sócrates como personagem fundamental neste contexto histórico. Um texto muito bom é "Introdução pensamento filosófico", de Karl Jaspers, em particular o momento em que este filósofo trata da "filosofia no mundo", indicando que a filosofia está em constante luta com várias anti-filosofias, e que ela mesma pode vir a tornar-se uma delas...

Em relação ao filme "The Matrix", é importante considerar os seguintes elementos: a inteligência artificial, que produz máquinas, mecanicamente reproduzidas em campos de criação, que sugam a energia corpórea e mental dos seres humanos, agora submetidos ao sistema da eficácia produtiva. A tecnologia dos programas de computadores gera, por isso, um sistema de domínio, a Matrix. O plano problemático da discussão está no controle da mente por esse sistema, pois o fornecimento de energia para as máquinas gera a reprodução de novas cópias, novas máquinas. Aqui, é possível trabalhar uma relação interessante com os conceitos de "sombras" e "realidade", desenvolvidos por Platão, no mito da caverna.

Sobre os personagens do filme, Neo é o "escolhido", pois ele, depois de um duro processo de aprendizagem e de busca, entra no campo da iluminação, isto é, compreende o conhecimento como uma jornada evolutiva, desde a sua dimensão corpórea, suas habilidades mentais, até os seus valores, os seus afetos e a sua liberdade de escolha, ou seja, o processo de busca pela verdade sobre si mesmo envolve o ser humano em sua totalidade. Morpheus é o personagem que ilustra o papel do filósofo, aquela seta que aponta caminhos e indica o processo de busca, que é iniciado dentro de cada ser humano, em sua consciência despertada (aqui, o professor poderá estabelecer uma analogia interessante com o conceito de "Buda", isto é, "aquele que despertou", e trabalhar novamente o papel de Sócrates entre os jovens atenienses). Trinity representa o amor, a via de acesso à plenitude humana, por meio da doação a uma causa suprema, que também dá sentido à liberdade humana. O oráculo, tal como na Grécia Antiga, tem o papel de indicar novos caminhos, por meio de uma revelação sobre quem somos, diante daquilo que julgamos saber sobre nós mesmos. Os agentes, homens vestidos de preto, comandados pelo agente Smith, ilustram os elementos que lutam contra a libertação da consciência da Matrix (vários são estes elementos que podem ilustrar a atuação dos agentes, tais como o poder da alienação, os interesses egóicos, a mente desequilibrada com o corpo, a fuga de si mesmo, a escravidão à posse de bens materiais, o desejo de dominação etc.).

Por fim, a Matrix representa a "caverna", o mundo sombrio, repleto de semelhantes aparências, mas que encobre a visão diante do Sol, que permanece fora da Matrix, imperceptível aos interesses imediatistas do agir sem conhecimento filosófico.

Aqui, o professor dinamiza o estudo levantando questões que podem ser desenvolvidas a partir da seguinte tarefa: os estudantes, reunidos em grupos, deverão agora criar uma Matrix, explicar a sua dinâmica funcional, e propor uma saída para ela. Depois, os trabalhos deverão ser apresentados sob a forma de seminários, debates, dramatizações e um texto escrito por cada estudante sobre a pesquisa desenvolvida.

Até o próximo diálogo entre filosofia e cinema.

Jorge Leão

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Para além dos muros das cátedras...

Um texto recente, sobre os intelectuais, suas cátedras, seus saberes, sua condição contemporânea e suas implicações. Abraços quixotescos! Jorge Leão

Para além dos muros das cátedras...

Precisamos sair dos guetos acadêmicos que nos mantêm distantes da realidade da vida. Um “intelectual” que se confina a seus manuais de pesquisa perde-se no mar de seu preciosismo acadêmico. Este é o intelectual com o uso das aspas...

O mundo exige respostas. A natureza clama por soluções para os problemas que nós humanos, ditos “racionais”, causamos a ela. Nossos preconceitos, arraigados na idéia classista de uma escola para poucos, geram mais barreiras e entraves diante da escassa oportunidade de acesso ao concorrido mundo do trabalho.

É extremamente oportuna a inserção dos intelectuais (agora sem aspas) nos meios de comunicação, a fim de resgatarem o valor educativo do conhecimento e de seu papel na vida política e na cidadania. Nossos jovens crescem no medo e na incerteza, repletos de dúvidas e perdas. Ora, se o conhecimento realiza a busca pelo entendimento da realidade, não é possível pensar o professor fechado em seu hermetismo teórico, alimentado pela vaidade de seus títulos acadêmicos, que serão futuramente devorados por traças e cupins...

Necessitamos levar a filosofia à praça. A esfera da liberdade pública anseia por filósofos engajados. Assim também a ciência precisa respirar ares para além dos muros da academia. Precisamos de artistas engajados, formando platéias desde a infância. A alegria da vida necessita de mãos disponíveis para que novos sorrisos surjam.

Estamos vivendo num mundo de queixas, em que a violência e a descrença invadem nossas consciências, inibindo que sonhos e utopias rejuvenesçam nosso espírito. O muro das lamentações cotidianas se reveste de uma blindagem ideológica, preparada a todo instante para anestesiar a mente dos ouvintes. É necessário um esforço conjugado entre famílias e escolas, igrejas e associações de bairro, agentes culturais e governo, para que, desde cedo, nossas crianças possam descobrir a importância da filosofia, da ciência, do esporte e da arte em suas vidas.

Por isso, a linguagem acadêmica, em diálogo permanente com os diversos seguimentos sociais e políticos, deve fazer-se próxima dos mais distantes. Não admitir que a melhor estratégia sempre será a explanação de um discurso prévio, enclausurado em si mesmo pelos ditames de um racionalismo míope e indiferente aos fracassos e utopias de nosso dia-a-dia.

Necessitamos de uma leitura viva. Necessitamos de conhecimento permanente e atuante. Apostamos no risco dos intelectuais que almejam sempre ares mais rarefeitos. Os ares das montanhas geladas, como diria Nietzsche. Neste caminho, não haverá espaço para condecorações e vaidades inócuas. Ao contrário, nas veredas desta vida arriscada, será necessário um suor sagrado, repleto de disposição ao serviço por espaços de aprendizagem recíproca.

Jorge Leão

Professor de Filosofia do CEFET-MA e membro do Movimento Familiar Cristão, em São Luís – MA.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Comentários sobre o filme "Ponto de Mutação"


Caros amigos da sabedoria e da arte, o comentário deste filme não visa apenas relatar alguns de seus mais interessantes diálogos. “Ponto de Mutação” é também uma bela oportunidade de ilustrar um diálogo profundo entre filosofia, ciência, arte e religião, de modo dinâmico e interdisciplinar. Este filme poderá, desse modo, suscitar debates importantes sobre o papel do conhecimento no mundo atual e suas implicações éticas, políticas, sociais, econômicas e culturais para todos os seres vivos que habitam nosso planeta, tão belo e, ao mesmo tempo, tão depauperado pela corrida armamentista e tecnológica. Destacaremos a seguir aquilo que considero serem alguns dos aspectos essenciais do filme. Bom filme! E bom debate!

1 – Entre a visão e a perspectiva...

O filme “Ponto de Mutação” (1990), dirigido por Bernt Capra, é baseado na obra homônima do físico austríaco Fritjof Capra, e aborda várias questões ligadas à ciência, filosofia, política, religião, ecologia, sentido da vida, criação estética. O ambiente para isso é o lindo cenário no litoral noroeste da França, no alto do Mont Saint Michel, uma construção medieval localizada na fronteira com a Normandia e a Bretania. Em suma, o debate entre um poeta, Thomas Harrimann (John Heard), um ex-candidato a presidência dos EUA, Jack Edwards (Sam Waterston), e uma cientista, Sonia Hoffmann (Liv Ullmann), aborda o problema dos paradigmas que norteiam o conhecimento científico, de seus conflitos teóricos, de suas implicações para a vida dos seres vivos e o grau de envolvimento que cada ser humano tem, quando da consciência destes problemas. É um filme com diálogos complexos, que nos incita a promover também debates profundos sobre as temáticas por ele apresentadas.


Inicialmente, o diálogo inicia-se com o poeta questionando ao ex-candidato à presidência dos EUA sobre o fato de termos de abandonar os princípios morais para adequar-se ao sistema. É a velha questão: “abandonei meus princípios porque tento mudar as coisas inserindo-me no sistema?”.


O poeta afirma ao político: “este lugar parece um conto de fadas... achei que gostaria de vir aqui para descobrir aquela qualidade preciosa tão em falta no mundo”.


Ao que Jack Edwards responde: “visão”...


E o poeta: “perspectiva. Perspectiva, Jack”...


Eis o cerne da questão, duas visões de mundo completamente antagônicas: a visão pragmática do político que visa resultados práticos, e a perspectiva do artista, que vê a realidade a partir de um processo criativo, alimentado pela descoberta da beleza e do enlace poético com a existência.

2 – Os modelos de tempo


No início, os homens não tinham relógio, e o tempo não era mecânico. Eram as estações que regulavam o registro dos acontecimentos. Até idéias religiosas, como a do Juízo Final, estava movida por este enlace primordial com a natureza. Por isso, o tempo era sagrado. Esta explanação confunde a mente de Jack. Assim, ele afirma: “não consigo me concentrar em nada que não seja específico. A poesia apenas me confunde”...


Somos interligados pelo sagrado tempo da memória, mas esta civilização, a do domínio da técnica desconhece seus deuses. Segundo o tempo de nossas origens míticas, estamos todos interligados. “Ninguém é uma ilha. Todo homem é parte do continente, portanto, nunca pergunte por quem o sino dobra... ele dobra por você”.

3 – A fragmentação da consciência


Ao entrarem no interior da igreja, eles ficam extasiados com a sua grandeza arquitetônica, enfatizando que isto constituiu uma estratégia para diminuir a individualidade do homem diante da infinitude divina, largamente utilizada pela Igreja Católica no período medieval. Contudo, a moderna sociedade secularizada coloca o indivíduo no centro de tudo, o que acaba por transformá-lo em uma parte desconectada do todo, movida apenas por interesses particulares.

4 – A sala das engrenagens e a crise de percepção


Neste momento, a figura da cientista entra em cena, seu nome é Sonia Hoffmann, e ela passa a argumentar sobre o tempo mecânico, ilustrado pelas engrenagens do relógio, que se tornou o modelo do cosmos, e seus idealizadores “achavam que a natureza era só um grande relógio, não uma coisa viva. Uma máquina”.


Os cientistas lêem pouca poesia, e os políticos têm idéias parecidas com este relógio. O pensamento do filósofo francês René Descartes (1596 – 1650) serviu como fundamento teórico para os cientistas no século XVII, e ainda hoje influencia o mundo, inclusive os projetos políticos. Entretanto, a ciência avança e a tecnologia inaugurou a era do microchip, do tamanho de uma unha, substituindo as pesadas engrenagens. Este modelo impõe um modo de conceber as coisas a partir de seu funcionamento, e o benefício lucrativo é o resultado de uma apropriação da natureza e de seus recursos. Assim, florestas inteiras, como a Amazônia, sofrem o risco de sumirem, porquanto a lógica econômica determina o que produzir e para quem vender.


Os problemas contemporâneos são de ordem global e não podem ser compreendidos como peças isoladas, ignorando o conjunto, que se conecta com cada parte. Tudo está conectado. A medicina, os gastos com pesquisas, novos hábitos alimentares, a agricultura, são exemplos de conexões. Precisamos começar a mudança partindo da nossa maneira de ver o mundo, uma vez que “todos os problemas são fragmentos de uma só crise, uma crise de percepção”. O sistema médico assemelha-se à política, não encorajando a prevenção, só a intervenção, por isso, segundo Sônia, “precisamos de uma nova visão de mundo”, superando a visão cartesiana, reconhecendo suas limitações, sua visão do mundo como máquina, e encontrar novas maneiras de abordar a realidade, via conhecimento holístico.


A natureza possui dois princípios complementares, o masculino e o feminino, mas “os homens criaram ferramentas e armas, físicas e intelectuais para desequilibrá-los completamente! Demos ferramentas mecanicistas a pessoas sedentas de poder”, comenta Sonia, de modo enfático.

5 – A ciência entra em crise: o drama da responsabilidade ética


Sonia é perguntada por que está naquele lugar. Ela responde que suas pesquisas com laser, que poderiam ser utilizadas para a pesquisa com o câncer, foram aplicadas ao programa Guerra nas Estrelas. Eis o motivo. Isso a fez rever suas pesquisas. A física moderna também foi obrigada a mudar seus conceitos. Os físicos, “após muitos anos de frustrações, tiveram de admitir que a matéria não existe com certeza e em lugares definidos, mas sim mostra a tendência a existir”. A ciência se defronta com uma natureza repleta de eventos probabilísticos. Os elétrons não ocupam posições fixas, mas se manifestam como um padrão de probabilidades, espalhados pelo espaço, “e a forma deste padrão muda com o tempo, o que, para a percepção humana, pode parecer movimento”. O poeta inglês William Blake (1757 – 1827) é citado: “Se as portas da percepção se abrissem, tudo aparecia como é”. O poeta acomoda-se e começa a tocar no órgão a melodia inicial da música “Jesus Alegria dos Homens”, do compositor alemão Johann Sebastian Bach (1685 – 1750).


Para a física atômica, “a natureza essencial da matéria não está nos objetos, mas nas conexões”, como na harmonia musical, que para acontecer reúne em si as notas, que, ouvidas isoladamente, são freqüências de som, vibrando em determinada amplitude de onda. Desta harmonia surge a possibilidade de contemplar a beleza de uma composição musical.


Além da beleza, há também os impactos sociais e políticos que uma pesquisa científica pode acarretar. Segundo a cientista, “somos todos parte de uma teia inseparável de relações”. Ao visitar o museu da bomba de Hiroshima, pude observar “as vítimas de meu trabalho científico”. Na universidade, as implicações éticas da pesquisa científica não são ensinadas, mas sim uma idéia ultrapassada de “ciência pura”.


Além disso, os investimentos acadêmicos voltam-se cada vez para alimentar o desenvolvimento bélico. Nos EUA, por exemplo, 70% da pesquisa científica é paga pelos militares. A ciência realiza nas pessoas o otimismo ligado a um poder de transformar para melhor as coisas. Entretanto, o poder do conhecimento sem a sabedoria e os valores éticos é unilateral e limitado. Este aspecto é denominado de “cientificismo”. E é duramente questionado pela crítica elaborada por Sonia em sua exposição.

6 – O padrão holístico


Por isso, uma nova ciência deverá surgir, que compreenda os elementos da natureza de modo integrado, isto é, uma teoria “que coloca todas as idéias ecológicas de que falamos numa estrutura científica coesa e coerente. Nós a chamamos de teoria dos sistemas, dos sistemas vivos (...) em vez de concentrar nos blocos básicos, a teoria dos sistemas pensa nos princípios de organização. Em vez de picotar as coisas, ela olha para os sistemas vivos como um todo”.


Desse modo, a visão holística confronta-se ao modelo cartesiano, que compreende a natureza pela análise das partes que a compõem. Ao contrário, é necessário pensar as partes interligadas a um conjunto em equilíbrio, por um vínculo de interdependência. Por isso, “a teoria dos sistemas reconhece esta teia de relações como a essência de todas as coisas vivas”. Outro aspecto fundamental é a idéia de auto-transcendência, uma vez que “cada organismo vivo tem potencial para a criatividade, para surpreender e transcender a si mesmo”.


Por outro lado, a preocupação desenfreada pelo crescimento econômico precisa ser interrompida. Os números constituem um alerta: 40% da riqueza mundial está concentrada nos EUA, para alimentar 6% da população mundial. Segundo a cientista, “precisamos de uma sociedade sustentável, em que nossas necessidades sejam satisfeitas, sem diminuir as possibilidades da próxima geração”. Se quisermos viver em equilíbrio com a vida, precisamos pensar em ações voltadas para a permanência de futuras gerações no planeta.

7- O olhar do artista


O filme caminha para o seu fim. A grandeza da natureza parece agora suscitar inspirações poéticas. Surge a necessidade de uma palavra voltada para a percepção da realidade pelos olhos da poesia. Assim, o poeta Tom cita Pablo Neruda: “(...) Caminho, como tu, investigando a estrela sem fim... e em minha rede, durante a noite, acordo nu. A única coisa capturada é um peixe preso dentro do vento”. Ele, com isso, questiona tanto o poder político quanto o olhar da ciência, quer de caráter cartesiano ou holístico. Para ele, tais tentativas de nomear o mundo não resolvem o problema, pois a vida não cabe em estruturas conceituais ou modelos explicativos, posto que “a vida sente a si mesma”, e “(...) é infinitamente mais que as suas ou as minhas obtusas teorias a respeito dela”.


Sonia contempla o pôr-do-sol, refletindo sobre as palavras de Tom: “e as pessoas que você ama, como ficam em seu sistema?”; sua filha chega, abraça-a, e ela diz: “vamos embora”...


Os dois amigos aparecem andando. Jack diz: “acho que meu longo fim de semana na França está acabando. Talvez eu esteja cansado de ser um estrangeiro... afastado do ambiente que carrego dentro de mim. Nosso sistema emocional, ela diria, precisa ser nutrido. Não faz diferença. Você está preso às pessoas que conhece. Ela está certa, claro, sobre quase tudo. Até o que eu não entendi parecia estar certo. Então, devo aceitar isso? Este é um daqueles momentos de mudança?”...


Tom cita outro trecho de um poema, para ilustrar o desfecho do belo encontro:
“Você é a mulher; eu, o homem, este é o mundo e cada um é obra de tudo. Os passos silenciosos na areia, o desconhecido que se esgueira... Os dançarinos e anjos girando pela aldeia... e os lindos braços em volta de nós e do que conhecemos (...) esqueci o resto desta droga de poema!”...


O filme termina com a belíssima paisagem do castelo de Mont Saint Michel. Enfim, a harmonia retomada pelo encontro entre filosofia, ciência, arte, política e religião. Seria um bom momento para comemorarmos a alegria de estarmos vivos, habitando um belo planeta, fruto da perfeição infinita de Deus e da fraterna convivência entre seres humanos e todos os organismos vivos. Todos juntos, filósofos, cientistas, artistas, líderes políticos e religiosos, irmanados pela consciência ecológica de uma vida solidária.


Abraços quixotescos!
Jorge Leão
12 de Setembro de 2008

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Aspectos da fotografia em aproximação com temas de filosofia da arte

Caros amigos da sabedoria, indico neste texto sugestões para as aulas de filosofia da arte, tendo a fotografia como elemento fomentador da dinâmica. Boas imagens! Sempre!
Abraços quixotescos! Jorge Leão

ASPECTOS DA FOTOGRAFIA – aproximações com temas de filosofia da arte

Fotografar implica em um recorte da realidade > exige atenção e percepção.

A fotografia constitui um modo de documentação > em documentação há sempre um momento de aprendizagem.

É importante, se formos trabalhar no contexto escolar, levar a câmera às mãos dos estudantes, todos devem ter acesso à máquina; isso faz deles protagonistas do conhecimento. Aqui, é importante frisar o aspecto fundamental da autonomia intelectual, por exemplo, no pensamento de Paulo Freire.

A fotografia poderá constituir um grande instrumento para a formação de professores e estudantes, pois é uma linguagem que trabalha com as imagens. Estas, por sua vez, ajudam na formação de conceitos e idéias. Este é o vínculo de aproximação com os conteúdos filosóficos. A filosofia como experiência de criação de conceitos pode ser melhor compreendida no texto "O que é filosofia?", de Deleuze - Guatarri (RJ: Editora 34, 1992).

Fotografar possibilita o desenvolvimento da percepção. É, pois, uma forma de narrar a realidade. É diferente do desenho, da escrita, contudo ela amplia a experiência visual de quem registra a realidade pela fotografia.

A narração é uma forma de manter-se vivo. Narra-se para não morrer (ver Sherazad, em “Mil e uma Noites”; e o personagem de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis).

Relações entre Fotografar e filosofar: Olhar profundamente as coisas > criar âmbitos de liberdade por meio das imagens fotografadas > a representação é um modo de conhecer o mundo.

O entendimento de percepção aqui corresponde à interpretação dos estímulos oriundos da realidade. Assim, a percepção de quem fotografa jamais será o conhecimento exaustivo e total do objeto, e sim uma interpretação provisória e incompleta, fundamentada em indícios ou sinalizações. (Cf. ABAGNANO, N. Dicionário de Filosofia, Percepção, pp. 753-756).

Representação: origem medieval, indica: imagem ou idéia, ou ambas as coisas. O uso desse termo foi sugerido aos escolásticos (séc. XIII) pelo conceito de conhecimento como “semelhança” do objeto. “Representar algo” – dizia S. Tomás de Aquino – “ significa conter a semelhança da coisa”. Em Descartes, o termo passa a ter importância com a noção de “idéia” como “quadro” ou “imagem” da coisa (Meditações, III). Deve-se a Wolff (filósofo alemão, início do séc. XVIII) a difusão do uso desse termo nas outras línguas européias. Kant (1724 – 1804 ), na Crítica da Razão Pura (Dialética, livro I, seção I) estabeleceu seu significado mais geral, considerando a representação como gênero de todos os atos ou manifestações cognitivas, independentemente de sua natureza de quadro ou semelhança. (Cf. ABAGNANO, N. Dicionário de Filosofia, Representação, p. 853).

Temas como esses podem ser inseridos também em Introdução à Filosofia da Arte, em que tópicos como "percepção", "imagem", "representação", constituem elementos importantes para a experiência estética, aqui exemplificada pela fotografia.

Abraços quixotescos!

Jorge Leão
Em: 25 de Outubro de 2007

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Comentário sobre o filme "Nós que aqui estamos por vós esperamos"

Amigos, mais uma contribuição de nossa "amiga da sabedoria", Dayanna, colaboradora de nosso projeto FILOSOFIA COM ARTE NO ENSINO MEDIO, hoje estudante do curso de Psicologia da UFMA. Aqui, um texto sobre o filme "Nós que aqui estamos por vós esperamos". Obrigado, Lady Day, beijos no coração. Até o próximo encontro sobre filosofia e cinema, abraços quixotescos! Jorge Leão

TEXTO SOBRE O FILME: “NÓS QUE AQUI ESTAMOS POR VÓS ESPERAMOS”

O filme Nós que aqui estamos por vós esperamos, de Marcelo Masagão, chama atenção sobre os acontecimentos históricos e os personagens que viveram durante o século XX. Montado somente por imagens dos grandes pensadores, recortes de vídeos que retratam a vida no trabalho e na família das pessoas, obras de arte e com uma música melancólica de fundo, quem assiste percebe que o mundo sofreu muitas mudanças durante este século, e que tiveram conseqüências de progresso ou de destruição.

É sabido que no século XX surgiram muitas teorias, revoluções, evoluções tecnológicas e junto com tudo isso, com grande velocidade, também nasceram outros valores na sociedade. O filme leva à reflexão sobre o papel do homem nessa sociedade das máquinas, do pragmatismo e do consumismo, que usou de tantas vidas nas guerras para conseguir firmar-se nesses valores.

Os sinais de progresso deste século são visíveis ainda hoje, e dependemos desse desenvolvimento nas ciências tecnológicas e sociais, que vão deste a invenção da máquina fotográfica até as teorias de Sigmund Freud e Albert Einstein. Também nas artes é possível enxergar esse movimento, afinal o artista sempre externa em sua obra sua percepção sobre o mundo em que vive.

Porém a mesma mente humana foi capaz de construir a bomba atômica. Uma frase que ilustra o filme diz: Os homens recriam as ferramentas e as ferramentas recriam os homens (McLuhan). E em meio às mortes nas guerras, milhares de homens e mulheres precisam apertar parafusos em linhas de produção para sobreviver em longas jornadas de trabalho, vivem em péssimas condições de moradia e saúde. Enquanto homens poderosos abusam de seu poder e força política contra os oprimidos nos campos de batalha. Tudo caminha segundo as regras do individualismo.

Nós que aqui estamos por vós esperamos é um filme rico em significados. Por isso, podemos destacar, ainda, sua evidente discussão sobre a falta de humanidade latente na sociedade. As imagens de guerras são as que ficam mais fortes, e percebe-se que o soldado já não se importa em ter a seu lado restos de corpo humano. A vida perde o valor. E quem sofre com esse desprezo apenas espera.

O encerramento do filme com a imagem do cemitério parece um alerta dos que já morreram para nós, que também somos abalados pelos ideais do século que passou e que ainda sofrem mudanças. É como se ouvíssemos os mortos nos dizer para termos mais disposição em preservar a vida. Eles nos esperam lá, afinal todos, mesmo importantes ou não, temos o mesmo fim. Contudo, é preciso fazer nossa participação nesse mundo para que ele seja melhor.

Dayanna Gomes Santos - estudante do curso de Psicologia da UFMA

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Comentário sobre o conto "O Sonho de um Homem Ridículo", de Fiódor Dostoiévski


Caros amantes da Filosofia e da Arte, apresento-lhes um texto de nossa ex-aluna, hoje estudante de Jornalismo, e escritora, Talita Guimarães, sobre um texto lido no CEFET-MA, durante as aulas de filosofia, do romancista russo Fiódor Mikhailovicht Dostoiévski (1821 - 1881), intitulado "Um Sonho de um Homem Ridículo". Obrigado Talita pela valiosa contribuição. Autores como Dostoiévski constituem leitura fundamental para uma necessária aproximação entre Filosofia e Literatura. Abraços quixotescos! Jorge Leão
Dostoiévski: a verdade faz o homem ridículo

Narrado em primeira pessoa, "O Sonho de um Homem Ridículo", escrito por Dostoiévski, centra-se no relato feito pelo próprio narrador, também personagem principal que a verdade em torno da vida e das pessoas, procurada ao longo dos tempos por filósofos e pensadores, está diretamente relacionada ao conhecimento do homem sobre ele mesmo. Sócrates pode ser retomado no discurso em que afirma "Conhece-te a ti mesmo", como passo primordial ao alcance da verdade acerca da humanidade e assim, do universo, que em harmonia e conjunto é capaz de levar à felicidade e à paz.

Nessa perspectiva, o imaginário é enfatizado sob a ótica de uma metáfora que dá a idéia da vida plena. Percebe-se isso quando após cometer o suicídio, em seu sonho, o personagem principal morre apenas fisicamente uma vez que sua consciência mantém-se ativa e o deixa ciente de que está morto quando há a percepção do velório, do enterro e até mesmo da sensação dentro do caixão já enterrado. O homem dito ridículo faz, então, após sua morte, uma viagem que ultrapassa o planeta Terra e segue pelo espaço até um outro lado homólogo ao sistema solar. Um outro mundo mostra-se possível ao personagem, em um planeta Terra composto por tudo que caracteriza um verdadeiro paraíso.

Assim, a reflexão sobre essa questão, permite compreender que Dostoiévski produz uma obra de valor inestimável já que o conto "O Sonho de um Homem Ridículo" transcorre dentro de uma leitura fácil, sobre o ponto de vista da linguagem utilizada, mas complexa dentro do contexto e da mensagem a ser transmitida. O conto reflete acerca das atitudes humanas que direcionam a sociedade ao caos e aos problemas agravados pela falta de consciência. O autor procura, repetidas vezes, convencer o leitor de que o grande potencial humano que leva à felicidade e a convivência em harmonia é o aparentemente inocente, mas essencial "amar ao próximo como a si mesmo".
Talita Guimarães é ex-aluna do CEFET-MA, autora do livro infantil "Vila Tulipa" e acadêmica do 3o período de Jornalismo da Faculdade São Luís.