terça-feira, 8 de julho de 2008

Artigo: Perspectivas Metodológicas sobre o Ensino de Filosofia no CEFET-MA

PERSPECTIVAS METODOLÓGICAS SOBRE O ENSINO DE FILOSOFIA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NO CEFET-MA

Jorge Antônio Soares Leão[1]

RESUMO:

O presente projeto, intitulado “Filosofia com Arte no Ensino Médio”, consiste em uma pesquisa sobre a relação entre filosofia e arte, nas atividades do ensino da disciplina de filosofia para estudantes da segunda série do ensino médio, turno vespertino, do Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão. O projeto é realizado por meio de um convênio interinstitucional com a Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão – FAPEMA – e seu foco de atenção delimita-se à questão da metodologia de ensino de filosofia no ensino médio, e o debate e socialização desta experiência em outras escolas que oferecem a disciplina de Filosofia em sua grade curricular.

Palavras-chave: Filosofia, Arte, Ensino, Metodologia, Ensino Médio


1 – A filosofia e seu ensino em diálogo com a arte

A filosofia constitui o saber pensar pelas causas, buscando os fundamentos da existência, cuja proposta última desemboca na realização integral do ser humano. Entretanto, no contexto específico da escola, observa-se que o ensino da filosofia, como uma disciplina curricular, ainda encontra-se vinculado a um esquema de temas e abordagens fixos na rigidez de aulas desmotivantes, sem qualquer relação com o dia-a-dia dos estudantes.

Por isso, este projeto de pesquisa pretende estimular professores e estudantes de filosofia a pensar juntos uma metodologia de ensino que se aproxime das questões essenciais da existência humana, sem que para isso tenhamos que distanciar os conteúdos filosóficos de seus ouvintes, por meio de uma linguagem hermética e descontextualizada da história vivida de cada participante da aula.

Este diagnóstico nos convida a pensar uma maneira de ensinar filosofia a partir da sensibilidade do estudante entendido com ser pensante, e concentrando o foco de seu objetivo na aproximação entre dois saberes tidos como inúteis, no contexto social, capitalista e pragmático, em que nos situamos. Sabe-se, contudo, que a filosofia e a arte possuem uma tarefa substantiva para a formação educacional do ser humano, pois seus processos de aprendizagem ultrapassam a mera fixidez de respostas prontas e acabadas, que muitas vezes inibem no jovem o despertar para o pensar e levantar questões a respeito de sua vida, a partir do que é transmitido pela escola. Por isso, vê-se a importância de desenvolver projetos de pesquisa que contemplem o ensino de filosofia a partir de uma experiência significativa para professores e estudantes.

Como é sabido, as imagens construídas pela sociedade do filósofo e do artista quase sempre estão envoltas em uma teia estereotipada de preconceitos. Dizer coisas que ninguém entende ou criar obras de arte com símbolos incompreensíveis são os elementos presentes na impressão imediata de quem lê um texto de filosofia ou visita uma exposição de arte. Entretanto, qual seria então o motivo de um tratamento como este?

Vive-se no tempo das relações velozes, em que tudo adquire mais ou menos importância se pode ser negociado pelas cotações econômicas do mercado. O próprio conceito de utilidade vincula-se à idéia de produtividade. Assim, ler um texto de Platão ou apreciar uma sinfonia de Mozart não levaria ninguém a nada, uma vez que suas tarefas estariam desprovidas de funcionalidade. Nesse sentido, uma bicicleta é mais “útil” que um compositor da música erudita ou um texto clássico de filosofia.

Então, surge a pergunta: qual a importância da filosofia e da arte, posto que não possuem utilidade imediata? Ora, pelo fato de alguma coisa não ser útil como um objeto dado, isso não quer dizer que tal coisa não seja necessária para a existência humana. “Nem tudo que parece ser inútil é desnecessário” (FEITOSA, 2004, p. 25). Por isso, pensamos que aproximar o olhar do filósofo à sensibilidade do artista conduz a uma possibilidade de compreender com maior profundidade o drama humano no mundo, repleto de valores, sonhos, idéias e utopias, mas também de fracassos, tristeza, conflitos e indiferença. Desse modo, conforme a análise de Charles Feitosa, em seu texto “Explicando a Filosofia com Arte”:

a parceria entre a filosofia e a arte torna possível tratar com alegria e leveza alguns temas importantes e complexos da cultura e da existência, tais como o sentido da realidade, o lugar da ciência na sociedade, as interpretações do corpo e da natureza, a relação entre arte e verdade, a transitoriedade do amor e a inevitabilidade da morte. (FEITOSA, 2004, p. 8)


Assim, a estima, a admiração e o respeito pela busca do sentido da existência podem transformar-se num momento de encontro de amigos e de intensa riqueza poética. Ainda que estejamos vivenciando momentos de distanciamento e indiferença em relação ao fazer pedagógico no contexto da escola pública brasileira, pensamos ser este projeto de pesquisa um compromisso social e político com a dinâmica existencial de nossos sonhos e utopias, a partir de um olhar crítico e de uma sensibilidade estética, que se renovam a cada novo abrir das cortinas para o início de mais um espetáculo, que devem ser as aulas de filosofia. Foram estes elementos que nos exigiram uma abordagem metodológica participativa e investigativa, contribuindo decisivamente para a constante melhoria na dinâmica das aulas e no próprio enfoque que se quer apresentar ao ensino de filosofia.

3 – O desenvolvimento do ensino de filosofia por meio da pesquisa

O ensino de filosofia precisa vincular-se ao contexto do estudante, no caso aqui a realidade do Ensino Médio. A partir deste pressuposto, vê-se o quanto o desenvolvimento de um projeto de pesquisa pode favorecer uma experiência significativa com o processo pedagógico em sala de aula. Desse modo, surgiu o projeto “Filosofia com Arte no Ensino Médio”, com o propósito de alcançar os seguintes objetivos:

- Promover um diálogo enriquecedor entre filosofia e arte, por meio de uma metodologia de ensino de filosofia significativa, investigativa e dinâmica;

- Estimular professores e estudantes de filosofia a pensar juntos uma metodologia de ensino que apresente os conteúdos filosóficos de modo significativo diante do contexto vivido pelos estudantes do ensino médio;

- Elevar o olhar do estudante do plano imediato das normas, fatos, leis e dados para o caminho da descoberta filosófica, a partir do diálogo entre os conteúdos de filosofia e as diversas linguagens e manifestações artísticas.

Vale ressaltar, que, para o pleno desenvolvimento de um projeto de iniciação científica, será necessário o total envolvimento do professor, que deve assumir a postura de um orientador criterioso, inserido no acompanhamento do cronograma, e situado na relação estabelecida entre a pesquisa e o contexto da sala de aula, isto é, ponderando e avaliando constantemente os passos propostos quando da elaboração do projeto de pesquisa. Por isso, fez-se necessária a prática de encontros semanais com os estudantes bolsistas, em grupos de estudos, onde foram debatidos e aprofundados os temas da pesquisa, assim como percebidos os fatores que possivelmente pudessem inibir o bom andamento da mesma.


4 – A contextualização da experiência no CEFET-MA

O Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão – CEFET-MA - é uma instituição da rede federal de ensino, de caráter híbrido, tendo em seu âmbito interno realidades de ensino médio, ensino médio integrado ao ensino técnico, ensino técnico-profissionalizante e ensino superior. Diante desta multiplicidade de experiências, várias são as diferenças, desde o projeto pedagógico de cada curso oferecido, até as dificuldades de um planejamento interdisciplinar, diante da estrutura organizacional da escola.

A realidade sócio-econômico-cultural também é diversa, com alguns alunos situados em condições boas a nível sócio-econômico e outros sem grandes recursos financeiros, exigindo dos professores um profundo conhecimento dessa realidade, a fim de contextualizar suas disciplinas com tais elementos sociológicos. Os alunos bolsistas do projeto “Filosofia com Arte no Ensino Médio” são alunos sem grandes condições econômicas, o que em momento algum vem dificultando a participação dos mesmos na realização das atividades da pesquisa, pois se observa grande interesse e responsabilidade por parte de todos.

Assim, as atividades foram iniciadas, partindo do enfoque de leitura de textos direcionados para as temáticas envolvendo a metodologia do ensino de filosofia e sua articulação possível com as linguagens de arte. Após o estudo introdutório sobre filosofia da arte, seguido das visitas a centros culturais e apresentações artísticas, e apresentação de relatórios críticos sobre cada apresentação, os alunos bolsistas puderam escolher uma linguagem de arte que mais se identificavam (literatura, música, cinema, teatro, artes plásticas, etc.), e relacionar com os conteúdos de filosofia, a fim de perceberem como a arte, em suas múltiplas possibilidades de expressão, pode contribuir para dinamizar as aulas de filosofia.

Desse modo, cada observação correspondeu a uma abordagem metodológica, em sintonia direta com a dinâmica das aulas, propondo os alunos pesquisadores sugestões ao professor, para o enriquecimento da metodologia de ensino de filosofia. Com as sugestões, o professor analisa conjuntamente com os alunos os elementos a serem encaminhados para o plano pedagógico de sua escola. Após esta coleta de dados, foi concluída a pesquisa, servindo de base para o resultado final do projeto, com a elaboração de artigos do professor e dos alunos bolsistas, para serem socializados para toda a realidade da escola. Este deve ser o momento culminante do projeto, por meio da socialização da pesquisa desenvolvida.

Desse modo, enquanto atividade pedagógica direcionada para a pesquisa, centrada no problema da metodologia do ensino de filosofia, este projeto vincula-se à necessidade do desenvolvimento de atividades centradas em dois momentos principais, a saber: uma pesquisa bibliográfica e uma pesquisa de campo. O levantamento bibliográfico, o fichamento e a leitura filosófica dos textos foram realizadas durante o período de outubro de 2006 a outubro de 2007, pelo convênio PiBiC – Jr, em parceria do CEFET-MA com a Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão – FAPEMA – juntamente com visitas a centros culturais e eventos artísticos, onde os alunos bolsistas elaboraram relatórios de pesquisa, a fim de relacionar as linguagens de arte estudadas – música, literatura, teatro, cinema, dança e artes plásticas – com os conteúdos filosóficos trabalhados em sala.

5 – Avaliação dos resultados da pesquisa

Com o desenvolvimento da pesquisa, foi possível observar os seguintes resultados:

- Descoberta da importância da arte como elemento de interlocução com o saber filosófico, enquanto situado em sua prática de ensino.

- Que os conteúdos de filosofia podem levar a uma reflexão crítica das imagens e manifestações artísticas em seus mais variados campos de atuação, assim como a expressão e apreciação estéticas podem conduzir o estudante de filosofia a um processo de elaboração conceitual motivado pela sensibilidade artística, enquanto condutora instigante da tarefa do pensar filosófico.

- Percepção da necessidade de uma metodologia de ensino de filosofia mais próxima do contexto vivido pelos estudantes do ensino médio.

- Mudança a partir do olhar do estudante no modo de entender o papel da escola no mundo de hoje, saindo do mero plano imediato das fórmulas, registros, arquivos, informações e dados do passado para o caminho da descoberta investigativa e da reflexão filosófica, a partir do diálogo entre filosofia e arte.

6 – Considerações finais

A previsão é de que o projeto possa ser continuado no CEFET-MA, como atividade acadêmica que se propõe a pensar o ensino da filosofia na escola. Ampliar esta idéia deve ser, portanto, uma prioridade, a fim de que outras escolas e professores possam tomar conhecimento deste projeto e contribuírem para a melhoria e aperfeiçoamento do mesmo. Por meio de seminários, encontros, mostras cientificas de ciência e tecnologia, cafés filosóficos e outros meios de divulgação, pode-se motivar outros colegas professores a desenvolverem experiências similares, com a elaboração de projetos de pesquisa que visem à autonomia intelectual de nossos jovens estudantes. Entendemos ser possível este caminho tanto para a filosofia, quanto para as demais disciplinas curriculares do ensino médio, inclusive permitindo outros meios de ingresso às universidades, que não o vestibular, muitas vezes reducionista e distante da autonomia intelectual pretendida pela filosofia e pelo conhecimento científico, a fim de levar em consideração experiências de projeto de pesquisa na realidade do ensino médio, pois o perfil de um estudante pesquisador, crítico, reflexivo e atuante é o que se propõe para as escolas, para as universidades e para o conjunto de nossa sociedade.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, Dalton José. A filosofia no ensino médio – ambigüidades e contradições da LDB. Campinas, SP: Autores Associados, 2002.

ARANTES, Paulo... et all ; MUCHAIL, Salma T. (org.). Filosofia e seu ensino. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes; São Paulo: EDUC, 1995.

CHAUÍ, Marilena. Filosofia – Série Brasil, Ensino Médio – Volume Único. São Paulo: Ática, 2005.

COLI, Jorge. O que é Arte. Coleção “Primeiros Passos”. São Paulo: Brasiliense, 2005.

DELEUZE, Gilles; GUATARRI, Félix. O que é a filosofia? Tradução: Bento Prado Jr. E Alberto Alonso Muñoz. São Paulo: Editora 34, 1997.

FEITOSA, Charles. Explicando a Filosofia com Arte. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

FOSCHEILD, Dominique e WUNENBURGER, Jean-Jacques. Metodologia Filosófica. Tradução Paulo Neves. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

GALLO, Silvio; KOHAN, Walter Omar (orgs.). Filosofia no ensino médio. Vol. VI. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

KOHAN, Walter (org.). Ensino de filosofia: perspectivas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002, 296p.

LIPMAN, Mathew; SHARP, Ann Margaret; OSCANYAN, Frederick S. A Filosofia na Sala de Aula. Tradução: Ana Luiza Fernandes Falcone. São Paulo: Nova Alexandria, 2001.


NUNES, Benedito. Introdução à Filosofia da Arte. São Paulo: Buriti, 1966.


[1] Professor de Filosofia do Ensino Médio no CEFET-MA.

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