quinta-feira, 24 de julho de 2008

Sócrates na Praça

Mais um texto de uma jovem filósofa da turma 204, Juliana, sobre o que aconteceria a Sócrates, ao se deparar com o cenário contemporâneo em que vivemos. Obrigado Juliana, pela valiosa contribuição!
Abraços em todos os amigos e amigas da sabedoria.
Jorge Leão

Sócrates na praça
O que Sócrates pensaria se pudesse viver os dias de hoje? Se fosse possível que Sócrates passeasse por uma grande cidade nos tempos atuais, veria ele pessoas apressadas, literalmente correndo a seu trabalho. Notaria a diferença, forte diferença, do uso de uma praça. Em seu tempo, ali se discutiam os problemas da pólis, ali eram tomadas todas as decisões referentes ao grupo “pólis”. Em nosso tempo, quando muito, a praça serve de lugar de encontro de amigos ou casais apaixonados.

Se alguém o chamasse para sua casa, notaria a falta de escravos. Veria o anfitrião ou um empregado pago fazendo seus agrados. Isso se pudesse entrar. Em nosso tempo, estranhos devem ficar bem distantes, nunca se sabe em quem confiar.

Ao entrar em uma biblioteca, veria muitos escritos, muito velhos e se impressionaria da vastidão de ensinamentos quase nunca observada pelas pessoas do nosso tempo. Se pudesse caminhar no centro comercial, veria pessoas falando com aparelhinhos colados aos ouvidos, como se dentro deles houvesse alguém escutando. Ouviria sons de carroças mecânicas, se movendo, incrivelmente, sem o uso de nenhum animal. Pessoas falando em cones emitindo um som demasiadamente alto, incompatível com a voz humana. Tudo se tivesse tempo, pois logo seria arrastado por uma multidão, que vai e vem em marcha acelerada.
Andando um pouco mais, veria casa onde se fazem leis e casa onde se fazem cumprir. Veria pessoas entrando e saindo dessas casas com ares de importância em carroças mecânicas das mesmas das que vira, sem deixar de observar que estas novas eram estranhamente mais atraentes. Claro que dependeria um pouco da sorte, eles teriam que ir a essas casas.

E se Sócrates pudesse entrar em uma de nossas escolas!? Aulas maçantes, assuntos estressantes e alunos que de qualquer forma tentam decorar o assunto que lhes será cobrado, sem saber sequer qual finalidade prática em suas vidas terá uma tabelas periódica ou a fórmula de Bhaskara. Alunos que depois de 12, 13, 14, 15 anos “estudando” terão seus destinos escritos por uma prova, segundo a qual a diferença entre ser bem sucedido e estar condenado ao fracasso total reside unicamente em marcar um “xis” no lugar certo. Veria que muitos jovens vão se perdendo em meio ao medo de “não conseguir dinheiro para comprar sem se vender”...

E ao assistir uma aula de filosofia, não veria nada mais do que alunos que aparentam não entender nada e uma leva de professores – salvo raras exceções - que não compreendem o porquê deles não entenderem. Não seria então o que eles também não entendem?

Nas ruas olharia para o alto, atraído por um barulho estranho. Veria um pássaro grande, muito grande, que voa sem bater asas, antes de tropeçar em um corpo no chão de alguém que, embora não pareça, está muito vivo para implorar por ajuda, uma intervenção divina. E se perguntaria, talvez, por que ninguém o socorre. Teria logo ali a resposta: porque ninguém o vê.

A noite cairia e ele não mais veria a multidão de horas antes. Estariam cansados da correria do dia. Veria estrelas brilhantes pregadas em montanhas que não eram de terra. Eram de algo duro, cinza e agora frio. Letras que não conhecia e pessoas magicamente ampliadas nessas estrelas, paradas em eterna pose, eterno sorriso.

Andando pelas ruas, com sorte achasse uma janela entreaberta para ventilar um pouco a sala de uma família que descansa, e para dentro olharia. Sóis pequeninos colados no teto fazendo da noite de fora o dia ali dentro. Uma caixa estranha cheia de fios ao longe que mantinha quase hipnotizado um jovem sentado a sua frente chamaria a atenção. Ouviria barulhos em uma caixa que emite som, veria pessoas seminuas ou se rindo como atores de comédia em outra que além de som traz imagens também. E talvez se perguntasse como cabe alguém ali dentro. Ou por que alguém perderia tempo com gracinhas tão escachadas. Até que chega o horário político e todos se retiram da sala. Dentro da caixa agora estavam pessoas que falavam a ele, tentando persuadi-lo a votar e “votar certo”, enumerando prováveis melhorias se fossem eleitos. E ficaria feliz: república.

Ao fim dos discursos, como num passe de mágica, voltaria uma dupla séria falando para a família que retornava à sala de mais um caso de corrupção e impunidade, e todos cansados disso, fariam cara de desdém ou exclamassem um “de novo”, seguido de algumas palavras de baixo calão. E confuso, talvez ele decidisse meditar em um lugar, em um tempo mais calmo. E Sócrates não mais ficaria feliz.

Juliana Galeno T - 204

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